domingo, 8 de março de 2015

A fonte tipográfica que levou um homem à loucura e deu origem a um mistério de 100 anos - Gizmodo Brasil

Ponte Hammersmith em Londres
Ninguém parecia notá-lo ali: um homem sombrio que costumava
repousar à beira da ponte Hammersmith (acima), nas noites de 1916, em
Londres. E ninguém parecia notar que, durante essas visitas, ele estava
jogando algo no rio Tâmisa. Algo pesado.

Ao longo de mais de cem viagens noturnas ilícitas, este homem cometia
um crime: contra o seu parceiro, dono de metade do que era arremessado
ao Rio Tâmisa; e contra ele mesmo, que motivou a criação daquilo que ele
resolveu jogar fora. Este indivíduo venerável, fundador da lendária
editora Doves Press e
a mente por trás da fonte Doves, era um homem chamado T.J. Cobden
Sanderson. E ele estava jogando dentro do rio as fontes de metal cuja
criação ele supervisionou meticulosamente.

Sendo uma presença importante no movimento Arts and Crafts
da Inglaterra, Codben Sanderson defendeu o trabalho manual contra a
industrialização. Ele era brilhante e criativo, e de algumas maneiras, um ludita
— porque ele acreditava que assim que morresse, a tipografia criada por
ele seria vendida pelo sócio com quem ele brigava, para uso em
impressoras industriais.

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Alfred, Lord Tennyson, Sete Poemas e Duas Traduções, Doves Press 1902.
Assim, noite após noite, ele deixava seu legado no rio, ferrando
metade do trabalho do sócio e destruindo para sempre uma tipografia bela
e lendária. Pelo menos era nisso que ele acreditava.

***

Depois de quase cem anos, em novembro do ano passado, um grupo de
antigos funcionários do exército – que hoje trabalham para o Porto de
Londres – se juntaram para descer ao fundo do Rio Tâmisa em busca de
pequenos pedaços de metal, talvez centenas de milhares deles, que Cobden
Sanderson jogou dentro do rio muitos anos atrás.

Eles fizeram isso a comando e custo de Robert Green, um designer que passou anos pesquisando e recriando a fonte perdida, que hoje está disponível no Typespec.
Conforme Green me disse em uma conversa por telefone, o Porto de
Londres hesitou em permitir que seu grupo de mergulhadores buscasse a
tipografia perdida. “A preocupação deles era que eu fosse um sujeito
maluco procurando por uma agulha em um palheiro e gastando um monte de
dinheiro com isso”, disse rindo.

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Cortesia de Robert Green
Não é difícil entender como Green parecia maluco. Um civil oferecendo
pagamento para que mergulhadores da cidade buscassem destroços nas
profundezas lamacentas do Rio Tâmisa, talvez por semanas, procurando por
pequeninos pedaços de metal que foram jogados lá por um designer
ensandecido há mais de cem anos? É, parece bem maluco.

No final das contas, demorou apenas vinte minutos para que eles começassem a encontrar pedaços das fontes de metal.

Green passou anos pesquisando a história de Cobden Sandeson, usando
psicologia forense para compreender os atos do homem que viveu cem anos
atrás, estudando como e onde ele teria jogado as peças. Green limitou o
local de busca em uma pequena porção do rio, e foi lá que os
mergulhadores encontraram a maioria das peças. “Eles gostaram muito da
ideia”, lembra Green. “Eles queriam encontrarar algo, e encontraram”.

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Cortesia de Robert Green
Nos dois dias de mergulho, eles encontraram centenas de peças de tipografia, conforme documentado por Justin Quirk do The Sunday Times,
que participou do mergulho. Mas não se tratava do conjunto completo.
Green lembra que a Ponte Hammersmith foi alvo de dois bombardeios do
Exército Republicano Irlandês, sendo que um deles fez as águas do rio
atingirem ondas de quase 20 metros de altura, depois que uma mala
carregando explosivos foi despejada próximo ao local onde foram
arremessadas as peças de tipografia.

Por isso, as peças de metal poderiam ter se espalhado por outros
lugares do rio. É também possível que algumas delas tenham sido
incorporadas ao concreto que é derramado nos arredores da ponte para
reparos.

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Foto por Dafinka/Shutterstock

***

Hoje, fontes tipográficas são basicamente pedacinhos de código
binário em nossos computadores. Mas a era da fonte digital é nova,
contando apenas com algumas décadas.

Cobden Sanderson e o sócio dele, Emery Walker, fundaram a Doves Press
em 1900. Walker era um homem de negócios, com muitas preocupações no
mundo, mas Cobden Sanderson era o perfeccionista criativo — um homem
obcecado com autenticidade e arte. Juntos, eles comissionaram uma
fonte para a imprensa deles, baseada na fonte Venetian do século XV.
Isso significava ter de pagar um “cortador” para criar “punhos” de metal
para cada letra da fonte — da qual uma matriz seria criada ao apertar
uma peça de cobre no punho de metal. Depois, a fonte poderia ser
inserida na matriz.

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Fotografia de Sam Armstrong, cortesia do Sunday Times
A fonte deles foi criada em 1899 e a dupla a usaria para criar belos
livros encadernados à mão, e projetados com o equilíbrio perfeito entre
trabalho manual e utilidade moderna. Cobden Sanderson era um pouco
esnobe, no sentido de apenas querer permitir que as melhores literaturas
fizessem uso da fonte dele – apenas “as mais belas palavras”. Eles
imprimiram Paraíso Perdido. Eles imprimiram a Bíblia inglesa. Hoje, cópias destes livros são extremamente raras, e custam milhares de dólares em leilões.

Mas em pouco tempo, a Doves Press estaria em apuros. De acordo com informações da TypeSpec sobre a parceria,
Walker queria fechar a empresa e dividir o metal — milhares de quilos
dele — da tipografia entre ele e Cobden Sanderson, e cada um seguiria o
próprio caminho depois disso.

Conforme explica o Sunday Times,
eles chegaram a um acordo que Cobden Sanderson manteria a fonte até o
momento de sua morte, e Walker seria o dono depois disso. Mas a ideia de
que um trabalho feito por ele cairia nas mãos de Walker o horrorizava.
Por isso, no decorrer dos anos seguintes, ele decidiu colocar um plano
em ação – um plano que privaria Walker de receber a parte dele do
acordo.

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Cortesia de Robert Green
“Ele levou alguns anos até decidir jogar a fonte fora: ele ruminou
por anos se deveria fazer isso ou não”, diz Green. Ele escreveu sobre a
possibilidade em longos diários (“ele seria considerado alguém que
compartilha demais” hoje, conta), deixando para trás informações
detalhadas sobre este tumultuoso pensamento. No fim, ele decidiu que
preferia destruir a fonte a vê-la feita em uma equivalência mecânica de
sua versão original. “Ele se apaixonou pela ideia”, alega Green. Foi o
próprio Cobden Sanderson quem disse: “Se Emery Walker quer encontrá-la,
ele terá que mergulhar”.

***

Green passou anos pesquisando a tipografia da Dove Press — ele até a
reprojetou, depois de milhares de desgastantes horas de pesquisa, e a
publicou em 2013 como uma fonte digital chamada de Doves Type, que qualquer pessoa pode comprar.

No entanto, há mais ou menos um ano, ele começou a se perguntar se
existiam destroços da tipografia que poderiam ser resgatadas do rio. “As
pessoas diziam que ninguém nunca as encontrou”, ele diz. “Mas também
não encontrei nenhum registro que alguém havia tentado procurar por
elas”.

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A fonte atualizada, cortesia de Robert Green.
O que nos traz a uma ótima questão: por que motivo alguém procuraria
por ela? O que a tornava tão especial, tão valiosa para ser salva?

A Doves Press era uma entidade única, mas, de algumas formas, espelha
o que acontece nos dias de hoje no mundo do design. No início da era
moderna, a Doves foi fundada para preservar uma arte que tinha centenas
de anos de idade. Mas ela também estava destinada a fracassar,
ficando marcada na história como uma excentricidade que morreu assim que
impressoras mecânicas chegaram ao mercado. Ela valorizava algo acima de
tudo: fazer as coisas à mão e com total dedicação.

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‘Oenone’, Alfred, Lord Tennyson, Sete Poemas e Duas Traduções, Doves Press 1902.
Para Green, que trabahou no mundo do design desde que era jovem, a
glorificação que o movimento Arts & Crafts dava a trabalhos feito à
mão existe até hoje. “A revolução industrial os assustou”, ele diz sobre
os designers daquele período, expondo como a digitalização desvalorizou
o trabalho de designers até os dias de hoje. “Uma parte inteira da
classe média é afetada”, diz. “O design gráfico está completamente
desvalorizado. É muito difícil se manter sendo um designer”.

Métodos tradicionais estão novamente se popularizando. “As pessoas
estão retomando a arte da impressão manual para se manter”, diz Green,
mais ou menos como fizeram Cobden Sanderson e seus contemporâneos. Não
só por causa da autenticidade que ela dá ao trabalho, mas também, diz
Green, “porque é divertido”.

***

É estranho imaginar que um designer nascido cem anos depois de Cobden Sanderson reconstruiu o trabalho de vida dele.

E de alguma maneira, Green remedia a briga entre Cobden Sanderson e
Emery Walker, o parceiro dele. Ao invés de vender as peças de metal da
tipografia que ele resgatou do Rio Tâmisa, ele manterá metade e dará o
restante para a Emery Walker Trust, entidade que transformou a antiga
casa de Walker em um museu sobre o trabalho dele.
Cem anos atrás, Cobden Sanderson disse que Walker teria que mergulhar
para conseguir a parte dele do trabalho. Estranhamente, ele terá a
metade que tem direito, graças à generosidade de Green.

Hoje, qualquer pessoa pode baixar e comprar a versão digital
de Green da fonte de Cobden Sanderson. “Ele provavelmente ficaria
horrorizado”, ri Green. Entretanto, ele não vê a versão digital da fonte
como uma recriação exata da original. É mais como um eco ou uma
simulação — tem vida própria.

É uma história que contempla as mais importantes e controversas
ideias sobre design do século passado. Cobden Sanderson reagiu —
criminalmente! — à ameaça que a profissão dele se tornaria irrelevante
com a chegada das máquinas. Hoje, designers ainda lutam para encontrar
significado e reconciliar o próprio trabalho com esta espécie de lógica
maquinária que nasceu com as tecnologias que Cobden Sanderson nem
poderia ter imaginado que existiriam.

Cem anos depois, as preocupações de um homem obcecado com arte ainda
ressoa sobre nós. Entretanto, sem computador — uma máquina à qual o
movimento Arts & Crafts se opunha — a fonte Doves não existiria.
Hoje, ela existe, uma amálgama de tecnologias e máquinas que estavam
apenas nascendo quando a fonte foi arremessada ao rio.

Você pode ler mais sobre esta história na TypeSpec e no Sunday Times.





A fonte tipográfica que levou um homem à loucura e deu origem a um mistério de 100 anos - Gizmodo Brasil

Tropicália




Tropicália

A designação de Tropicália para o movimento que mudou os rumos da cultura brasileira em meados e fim dos anos 1960 foi dada por Hélio Oiticica. O artista que, segundo suas próprias palavras, “não podia imaginar toda a sua extensão”, queria sim, apesar disso, dizer implicitamente, que ele “definia um novo sentimento no panorama cultural geral.” A tropicália com suas novas propostas em cinema, teatro, música popular e nas artes plásticas foi uma síntese desse novo pensamento que nas suas manifestações inter-relacionava as metas específicas de cada uma delas.
Mas mesmo quando se pensa de forma ampla e globalizadora a respeito do tropicalismo, subjaz a ideia de que não havia um direcionamento único capaz de dizer-se “o caminho” da tropicália.  A ponto de existirem opiniões como a de José Celso Martinez Corrêa que em 1977 apontava: “O tropicalismo nunca existiu. O que existiram foram rupturas em várias frentes.” Rupturas que foram se processando e desenvolvendo sem consciência plena de sua interligação e abrangência ou de qualquer ideia criadora geral que norteasse todas as manifestações que assumiu na arte e na cultura.
Das muitas vertentes artísticas, o cinema proporcionou talvez o maior alvoroço em termos de massificação.  Um filme como Macunaíma de Joaquim Pedro, um cruzamento do cinema novo com o tropicalismo, brotou num contexto de dependência cultural e econômica do assim chamado primeiro mundo.  O que levou a releitura da rapsódia radical de Mário de Andrade num viés social, político e econômico onde o ser brasileiro foi motivo de celebração-depreciação. 
O lado B do tropicalismo, mais virulento e extremado, encarnado por Torquato Neto, Capinan, Tom Zé, Rogério Duarte e Hélio Oiticica, por exemplo, aproxima-se pela trajetória e atitude das artes de Rogério Sganzerla, José Agripino de Paulo, Júlio Bressane e Ivan Cardoso. Sendo o filme síntese dessa relação, marginália e marginal, transformando método carnavalesco em teoria de montagem, O Bandido da Luz Vermelha de Rogério Sganzerla.
No teatro, a 1ª. Feira Paulista de Opinião reunia os principais dramaturgos brasileiros da época, contando com Lauro César Muniz, Bráulio Pedroso, Gianfrancesco Guarnieri, Jorge Andrade, Plínio Marcos e Augusto Boal. O espetáculo, de um modo geral, será marcado pelo enfrentamento desaforado ao poder.  Os rumos que tomava a oposição ao regime levariam a arte, assim como todos os setores significativos da sociedade brasileira, a se retrair e a repensar suas propostas de atuação para sobreviver à censura.
A música popular produziu um sem número de nomes emblemáticos tais como Caetano Veloso, Gilberto Gil, Gal Costa, Os Mutantes e muitos outros.  Mas na música, a iconoclastia e a transgressão ganhavam contornos de apropriação do mundo mercadológico, como dizia Caetano Veloso a respeito das lições de Gil: “(...)nós não podíamos seguir na defensiva, nem ignorar o caráter de indústria do negócio em que nos tínhamos metido.(...)”

 As artes visuais viviam o rigor e a subjetividade do concretismo e do neoconcretismo e as experimentações da Op arte e da Pop arte.  Artistas como Rubens Gerchman e Antonio Dias participam da exposição Nova Objetividade em março de 1967 no MAM do Rio de Janeiro.  Ivan Serpa, aderindo formalmente à abstração, ao lado de Ferreira Gullar e Mário Pedrosa funda o Grupo Frente em meados de 1954. Lygia Pape, junto com Hélio Oiticica, em 1959 é uma das signatárias do Manifesto Neoconcreto.  A arte transformou-se em múltiplas vertentes e pensamentos únicos e individuais, trazendo a radicalidade do subjetivo para o centro da proposta artística.
Em Tropicalismo, antropologia, mito, ideograma, Glauber Rocha explica que o tropicalismo trouxe de dentro os “nostri succhi (nossos sucos gástricos)”, trouxe uma consciência da “realidade brasileira em todos os sentidos e a todas as profundidades”.
Podemos dizer que a tropicália levou a uma retomada do conceito de antropofagia sem utopias nacionalistas.  Com a proposição de questionamentos sobre o que somos e o que pensamos sobre o que somos, foi uma verdadeira revolução em todos os aspectos do viver.

Mauricio Duarte (Divyam Anuragi)



segunda-feira, 2 de março de 2015

Os Pontiagudos Alongados – Sapatos Medievais


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Os sapatos com os dedos longos e extremamente torneados começaram a
ser usados no início do século XII na Europa Ocidental. As origens
desses sapatos foram, por fatos não muito comprovados e mais por
tradição, colocado nos pés do conde d’Anjou, que tinha a necessidade de
cobrir os dito cujos em virtude de deformidades enormes. Acredita-se que
seriam enormes joanetes ou dedos disformes e grandes, tanto que o
chamavam de o nobre pato. Outra tradição coloca a origem de tal sapato
vinda dos árabes, Oriente Próximo, e que a mesma teria existido desde os
sumérios, mas também sem possibilidades de comprovação histórica. Há
certos manuscritos, século XIII, que relatam cruzados citarem tais
calçados como sendo cômodos e que levariam tal comodidade aos seus
reinos e feudos. Esta última análise nos parece mais convincente, pois
há relatos de 12 cruzados transcritos em pergaminhos, encontrados em uma
embarcação náufraga, que foi encontrada muito bem conservada, no mar
Mediterrâneo, que nos diz que os mesmos, os cavaleiros, levariam vários
pares para as suas esposas e filhos.


Uma série de obras sobre a história do figurino medieval refere este
tipo de calçado de “pigases”, que parecem encontrar suas origens na
menção de pigaciæ e pigatiæ em Ordericus Vitalis, ou “pigache” em
francês. Estes referidos sapatos com pontas longas começaram a aparecer
no início do século XII. No entanto no decorrer dos anos suas pontas
foram crescendo exageradamente, crendo que mais longos os sapatos mais
elegantes e sofisticados eram eles. Algumas pontas atingiam mais da
metade do calçado, às vezes, atingindo mais de 20 cm. Os sapatos mais
longos eram “recheados” com acreditem, musgo, cabelo, lã e até farinha
de trigo.


As variações dos calçados em suas extremidades tinham como adornos:
rabo de peixe, serpente, escorpião e outras. Mas a maioria usava os


calçados sem maiores extravagâncias. Acho que os exageros ocorriam em
festas, grifo meu. Esse estilo, das pontas longas, permaneceu popular
ainda no século XIII e XIV, mas nunca desapareceu completamente ainda no
século XV, mantendo um padrão mais sóbrio e com tecidos de pelúcia,
veludo entre outros. Os sapatos com estilos pontiagudos foram em sua
maioria usados pela aristocracia, sendo que as pessoas comuns usavam
sapatos com pontas arredondadas, mas há certas controvérsias entre os
historiadores. As pesquisas continuam e certamente aparecerão novos
fatos e fontes comprovando outra tese, esse é o trabalho do historiador.




Paulo Edmundo Vieira Marques




fonte: Os Pontiagudos Alongados – Sapatos Medievais | Medieval Imago

Apresentando uma boa obra


Se você irá apresentar a obra nas editoras, é porque decidiu a trilha mais trabalhosa. Como foi explicado em uma postagem anterior, o primeiro passo é o foco; por qual trilha você irá percorrer. Mas antes, o escritor precisa saber de alguns detalhes notáveis.
Antes de tudo, você precisa registrar sua obra na Biblioteca Nacional. Encaderne a sua literatura, numere as páginas, preencha a ficha (disponível no site) e leve junto com o comprovante do depósito e com a cópia de suas documentações exigidas no escritório da BN. Eles lhe darão um número provisório e após algumas semanas, o definitivo. Com isso, a sua obra já está segura para ser analisada pelos editores, protegida legalmente de plágio.
Faça uma pesquisa de editoras que selecionam obras. Evite editoras muito grandes, porque elas demoram muito tempo para responder (no caso, para dar um “NÃO”; isso quando respondem), além de receber dezenas de livros por dia. E muitos deles são descartados sem sequer serem lidos. Tudo porque os autores também não se preocuparam em formalizar uma boa apresentação de suas obras.
Outra coisa que os autores precisam saber é que os editores não são bobos e não vão dar atenção a uma carta de apresentação cheia de propostas mirabolantes de "divulgação" e "marketing". Portanto seja justo e honesto porque a franqueza é a linguagem editorial.

Sugestão: Junto com a encadernação (ou arquivo do livro digital), anexe antes da obra o esboço do projeto editorial. Na ordem, coloque o projeto (livro xxx); autor (somente o seu nome); registro da obra; título; objetivo (romance de ficção); formato e dimensão (14x21 cm com aproximadamente 200 páginas); temática (“gótico lunático que pensa que é um vampiro”); público alvo; direitos autorais (coloque sempre "a combinar"); sinopse; e breve resumo do argumento, com descrição dos personagens.
Depois, apresente a obra e por último, a sua biografia.

Leo Vieira

terça-feira, 24 de fevereiro de 2015

“Eu nunca mais vou assinar uma carteira de trabalho na vida”


O chef Erick Jacquin fala sobre a dificuldade de manter um restaurante no Brasil, sua fama de durão e seu jeito de encarar as críticas

Erick Jacquin  (Foto: Época NEGÓCIOS / Alexandre Severo)
Erick Jacquin é um chef exigente ao extremo. Um dos mais premiados do Brasil, ele é uma das estrelas da versão brasileira do reality show MasterChef, programa de televisão produzido em mais de 40 países. Ao lado de outros dois cozinheiros renomados, Henrique Fogaça e Paola Carosella, Jacquin avalia chefs amadores e dispara frases nada amigáveis – “parece que você fez comida para as galinhas” ou “esse bife parece um bicho que vai andar”.
 
 
As frases divertidas - e sinceras demais – agora lhe rendem audiência, mas no passado lhe renderam processos trabalhistas. Estima-se que o cozinheiro tenha dívidas de R$ 1,5 milhão, entre falta de pagamentos a fornecedores e ações de ex-funcionários na Justiça. Seu restaurante, o La Brasserie, de alta gastronomia, fechou as portas no final do ano passado.
A fama de durão e de difícil convivência veio depois de empregados revelarem xingamentos e até arremessos de pratos pelo francês. À Época NEGÓCIOS, Jacquin afirmou estar mais calmo hoje em dia e que o seu jeito explosivo seria, na verdade, uma cobrança interna. “A exigência que eu tenho com os outros, eu tenho comigo. Ela está dentro de mim. Não é falta de respeito. Tem muita gente que me agradece”.

Agora, Jacquin tem a oportunidade de se tornar conhecido fora da cozinha - a sua exigência por qualidade já ganhou fãs pelo Brasil. “Eu gosto de botar pressão e gosto de trabalhar sob pressão. Um pouquinho de medo não faz mal”, afirma. Mas ele se recusa a contratar alguém novamente.

Você nasceu em uma cidade pequena do Vale do Loire, na França, e chegou ao Brasil em 1995. Porque decidiu vir para cá?
Quando eu cheguei ao Brasil, eu já era chef em Paris. Eu fui convidado a trabalhar aqui por um senhor chamado Vincenzo Ondei, que na época tinha um restaurante chamado Le Coq Hardy [restaurante no Itaim que fechou em 2008]. Fui convidado para ser o chef do lugar. Eu pensei muito nesse convite. Em outubro de 1994, vim conhecer o país. Fiquei por aqui uma semana. Voltei para a França, conversei com a minha esposa na época [a sommelière Katia Lefriec] e ela concordou. Nós mudamos em fevereiro de 1995. Imaginávamos passar três ou quatro anos, ganhar um dinheiro, voltar para a França e comprar um restaurante. No fim, estou aqui ainda.

Como você se apaixonou pela gastronomia?
Eu nunca quis fazer outra coisa. Desde moleque, eu sempre dizia que queria ser cozinheiro. Eu nunca imaginei fazer outra coisa, infelizmente.

Por que infelizmente?
Porque ser cozinheiro não é ter uma vida normal – é muito mais do que uma profissão, principalmente quando se quer fazer muito bem. Eu decidi o que eu queria fazer muito novo e comecei a trabalhar muito novo. Meus pais se preocupavam muito comigo, porque essa é uma profissão em que se trabalha enquanto as outras pessoas estão se divertindo. Não é fácil começar jovem, mas nunca foi um problema para mim, porque eu sempre me diverti trabalhando. Na realidade, eu nunca trabalhei. Eu trabalhei muito, mas nunca foi um trabalho, ainda não é um trabalho, é tudo – é a minha vida. Então, eu não me arrependo. Eu não sei se existe no mundo uma profissão que me deixaria mais feliz do que cozinheiro.

Você disse que trabalha muito. Quantas horas por dia?
Um cozinheiro que trabalhou 12 horas no dia teve um bom dia de trabalho. Agora, não é bom trabalhar muito. O chef que trabalha 18 horas, já não cozinha igual, já não consegue fazer coisa boa. No Brasil, por exemplo, o restaurante fecha muito tarde. Às vezes, até 1h da manhã. Na Europa, nenhum restaurante muito bom vai te receber nesse horário. Um bom restaurante na França fecha às 21h30, 22h no máximo. Você acha que o cozinheiro de um restaurante que abriu cedo tem vontade de fazer um prato à meia-noite? Impossível.

Quando você decidiu ser chef?
Eu nunca decidi ser chef, eu decidi ser cozinheiro, o que é muito diferente. Antes de ser chef, precisa querer ser cozinheiro. Mas aqui no Brasil todo mundo quer ser chef e não quer ser cozinheiro. A ordem é: primeiro vamos aprender a cozinhar, depois vamos ser chef e depois vamos aparecer na televisão. Tem muita gente que quer fazer televisão, antes de ser cozinheiro. E é por isso que aqui existem chefs que são péssimos cozinheiros. É lógico que eu não vou citar nomes. Mas tem, e muito. Essa profissão foi muito valorizada por aqui, assim como publicidade e advocacia. Eu não consigo entender como uma faculdade no Brasil vende curso de chef de cozinha. Existe curso de presidente da República? Existe curso de presidente de banco? Não, tem curso de economia. A escola é importante, mas um bom chef aprende na prática.

Como você começou na profissão?
Depois de escolher ser cozinheiro, meu pai pediu que eu fosse até a confeitaria da cidade onde eu nasci, um lugar de quatro mil habitantes, para trabalhar durante o Natal. Eu trabalhei durante o Natal e o Ano Novo e adorei. Tinha 15 anos. Depois, conheci um cara que tinha um buffet e fazia festa. Trabalhei lá no verão e adorei também. Eu dizia: é isso que eu quero fazer. Minha mãe queria que eu estudasse. E eu estudei, mas não queria. Eu queria mesmo era trabalhar. Depois, minha mãe me colocou em uma escola de gastronomia com duração de dois anos – mas em uma verdadeira escola, com 30 alunos. Lá tinha um restaurante aberto ao público. Nós cozinhávamos todos os dias, não era uma escola para faturar com dois mil alunos. Depois fui para Paris, onde eu realmente comecei minha carreira de cozinheiro até virar chef de cozinha em 1989, aos 25 anos.

Naquela época, quem te inspirava? Tinha algum grande chef conhecido?
Isso não existe. É bobagem. Eu nunca comprei um livro de cozinha, por exemplo. A minha inspiração vem do cheiro. O cheiro da comida. O cheiro do produto. A maioria das fotos dos pratos que estão nos livros, nos jornais ou nas revistas não dá pra comer. A imagem da foto do livro tem pouco a ver com o prato que é servido nos restaurantes. Tem comida para o livro, para a revista, para o jornalista e tem comida para o cliente. O mais importante da comida é o cheiro. Eu não me espelhei em ninguém, meu foco era só no cliente.

Hoje, você é um dos chefs franceses mais famosos do Brasil. Como você acredita ter chegado até aqui? Foi a sua obsessão por qualidade?
Perseverança e coragem – eu nunca desisti diante das dificuldades. Até porque, às vezes, a felicidade atrapalha mais que a dificuldade. Você acha que já chegou lá, que virou o chef do ano, que é o melhor da França no país. E, na verdade, é o contrário. É nesse momento que você tem que fazer muito mais. Porque não é fácil, muita gente tem inveja, muita gente quer pegar o seu lugar. Em dois momentos da sua vida você deve lutar: lutar para continuar em uma posição boa e lutar quando você não estiver tão bem. Todo mundo tem uma fase ruim, não é?

No MasterChef tem pressão o tempo todo. Pressão no trabalho atrapalha ou ajuda?
Depende do que você faz, depende do que você quer. O elogio atrapalha. Em alguns casos, se você disser para o cara que a comida dele está excepcional, ele vai relaxar. Eu não sou uma pessoa que faz muito elogios. Nunca fiz muitos elogios para as pessoas que trabalhavam comigo. Se eu fizesse um elogio, as pessoas até ficavam espantadas. Eu acredito que o elogio atrapalha. Eu também não sou uma pessoa que gosta de ficar recebendo elogios. Para ajudar alguém, você deve elogiar na hora certa. Se a pessoa estiver deprimida, você deve elogiar para ela voltar. Mas se as pessoas estão bem, você não pode elogiar – você vai diminuir o padrão do trabalho. No MasterChef, eu dei uma dura em vários candidatos para que eles ficassem. A pressão é importante. Eu gosto de botar pressão e gosto de trabalhar sob pressão. Um pouquinho de medo não faz mal.

O que é preciso fazer para ser um bom cozinheiro no Brasil?
Trabalhar. Não existe bom chef no Brasil, um bom chef na França ou um bom chef na Itália. Precisa trabalhar muito, aprender, mudar várias vezes de restaurante. Para chegar lá, você também não pode estar com pressa de ganhar dinheiro. Eu trabalhei muitos anos ganhando pouco. Demorei a comprar o meu primeiro carro, por exemplo. Ia trabalhar de trem em Paris. O meu quarto tinha 11 metros quadrados. O chuveiro era no corredor. Dizem que francês não toma banho, mas nós tomávamos muito, porque tínhamos o cheiro da comida [risos].  Se eu pudesse dar uma dica para ser um bom cozinheiro seria: faça uma faculdade de manhã de administração e trabalhe em um restaurante durante a noite – muito melhor do que entrar em uma faculdade que tem professores de 24 anos, que são ex-alunos da escola. É besteira. Se eu pudesse dar uma dica para ser um bom chef, seria: ouça os seus clientes. Muitas pessoas não gostam de ouvir os outros, mas os chefs têm obrigação de ouvir os clientes. Os clientes são as estrelas do restaurante. Não são os jornalistas que dão as estrelas, são os clientes. Eu pergunto aos meus clientes sobre a comida. Às vezes, eu não concordo, mas eu pergunto.

O bom chef deve se dedicar só a cozinha, sem se preocupar com a administração?
Eu não sou a melhor pessoa para responder a essa pergunta [risos]. Existem chefs que são bons administradores e outros que são péssimos. Acho que a administração toma muito tempo de um restaurante e o chef fica sem tempo de cozinhar. Ele não deve administrar o local, mas deve no mínimo se interessar pelas contas – ele precisa saber quanto pode gastar, por exemplo, mas não deve pensar só em números.

Quem é o melhor chef do Brasil para você?
Eu nunca vou falar isso. Nem sei. Não acredito nisso. Não tem um chef melhor que o outro, cada um tem a sua especialidade e experiência.

Em novembro do ano passado, o seu restaurante francês La Brasserie fechou as portas por problemas de administração após nove anos. Onde você errou? O que faria diferente se pudesse?
Quando eu abri esse restaurante, há dez anos, errei de local. Errei de bairro. Não tenho nada contra Higienópolis, mas a cidade mudou - e é um inferno agora. Os meus clientes do Morumbi não iam mais lá, por exemplo. Os clientes falavam: “Jacquin, me desculpe, mas o seu restaurante é contramão, é muito longe”.  Outro erro foi que eu tive muitos funcionários. Se um dia eu abrir outro lugar, vai ser um local bem pequeno. Só para mim, sem sócio. Além disso, iria fechá-lo aos finais de semana e só ia deixar aberto até 22h30. É muito difícil de administrar e eu não estou falando só da parte financeira. Fechar o restaurante foi uma decisão certa, porque hoje as pessoas lembram dele de uma forma positiva – elas lembram do bom serviço e da boa comida que nós servíamos. E eu não queimei o meu nome.

Então você pensa em abrir outro restaurante?
Não, eu nunca mais vou assinar uma carteira de trabalho na vida. Até que o Brasil passe por reformas, nunca mais vou assinar uma carteira de trabalho. Vai chegar uma época em que ninguém mais vai querer ter funcionário, só as grandes empresas. A injustiça é o que mais me incomoda. Eu não sou milionário, sou cozinheiro e trabalhador. Eu não fui o chef que não trabalhava. Precisa ser muito corajoso para pedir um alvará de restaurante no Brasil. É documento atrás de documento. Pode ser que o governo esteja certo, mas eles precisam facilitar o processo.

Todo mundo conhece o seu jeito explosivo. Esse jeito, que antes te atrapalhava na La Brasserie, hoje te favorece no MasterChef?
Pode ser. O MasterChef me deu a oportunidade de mostrar quem eu sou. Eu não mudei. O meu personagem sou eu. Mas era bem mais duro no meu restaurante do que no MasterChef. Aliás, nem sou tão duro no MasterChef.

Você ganha dinheiro participando do programa? 
Não. Tem uma ajuda de custo. Com o programa, eu espero ganhar dinheiro no futuro. O MasterChef é a oportunidade de ser conhecido por um público diferente. Hoje, eu sou conhecido pelas classes A e B – e o programa irá me fazer muito mais conhecido.

Você tem sido abordado nas ruas pelas pessoas?
Às vezes, sim. As pessoas me chamam de bravo [risos] e eu recebo muitos elogios também.

Estima-se que você e a La Brasserie possuam dívidas e ações trabalhistas de R$ 1,5 milhão. É verdade? Como você pretende pagar essas dívidas?
Como você acha que se paga uma dívida? Em dinheiro [risos]. Se alguém aceitar uma permuta, precisar fritar um ovo, eu vou. Já paguei alguns fornecedores trabalhando. Mas tem dívida que vai ser difícil pagar. Eu sei que não vai ser fácil. Hoje, eu vivo de fazer jantares nas casas das pessoas. Não é todo dia que tem, mas tem. Com o MasterChef, eu vou ter mais oportunidade. O meu restaurante era caro, cerca de R$ 300 por pessoa. O cara que ia lá nem sempre tinha muito dinheiro. Alguns iam só quando era aniversário de casamento, por exemplo. Eu vendia uma mesa dentro da cozinha por R$ 1,3 mil para duas pessoas. A qualidade tinha que ser impecável. Perguntava para as pessoas que trabalhavam comigo: ‘Imagina que esse prato vai custar R$ 120, você pagaria? Não? Então porque você quer que os outros paguem? Porque os clientes devem pagar pela merda que você faz?’ Agora, sobre o valor das dívidas: eu não fiz a conta. É sério, mas deve ser por aí.

Hoje você está mais tranquilo ou continua arremessando pratos nas pessoas? Essa história é real?
Hoje, eu sou muito mais tranquilo. Estou mais velho e, depois que fechei a La Brasserie, tenho muito menos pressão. Não foi fácil fechar esse restaurante. Muita gente só olha o meu lado durão, só fala que o estabelecimento fechou. Eu chorei muito. Os bancos não queriam mais conversar comigo. Tentei muito, lutei muito. Muitos funcionários me ajudavam e gostavam de mim. O problema é que as pessoas só gostam de valorizar o que não deu certo. Teve funcionário que falou mal de mim, mas que trabalhou só três meses comigo. Esse não sabe quem eu sou. Eles falam mal, mas quando vão procurar emprego dizem que já trabalharam com o Jacquin. Pode me odiar, pode falar tudo que eu sou, pode ser que seja verdade, mas todo mundo fala que trabalhou comigo. Eu nunca prejudiquei um ex-funcionário. Nunca disse para não contratar alguém quando me pediam referência. Eu quero ver as pessoas felizes para que elas parem de falar mal de mim.

Você lida bem com criticas?
O que você acha? Se os clientes forem justos e honestos, eu não tenho nada contra. A crítica é muito boa. Eu gosto de polêmica, eu sou polêmico. Mas a crítica me incomoda quando ela é ignorante. A ignorância me incomoda. Eu sofri muito com uma matéria mal escrita divulgada em uma revista há dez anos. As pessoas pediam para eu não me importar, mas a matéria falava mal de tudo, não tinha nada de positivo. A crítica, até no MasterChef, sempre tem um lado positivo, não existe só o lado negativo. Tudo na vida tem um lado positivo. Todas as pessoas que trabalham no mundo merecem um lado positivo.

Em que momento o talento atrapalha?
O talento atrapalha quando os outros ficam com inveja do seu trabalho. O talento mesmo nunca atrapalha - o que atrapalha são as pessoas que querem te atrapalhar. A vida é um reality show. Hoje, eu tenho certeza que a vida é um jogo. Acredito que talento não é nada sem trabalho duro e perseverança. Músico é assim: tem gente que tem talento para tocar piano, por exemplo, mas se não se esforça, vai tocar de uma forma média. Tem gente que não tem talento, mas trabalha todo dia, toda hora – esse vai conseguir tocar piano muito bem.

Você disse que o que atrapalha é a inveja. Você sofreu muito com isso na sua carreira?
Não. Eu tinha muitos amigos. O que me faz sofrer é que as pessoas só valorizam as coisas negativas que aconteceram comigo. Tem ex-funcionário que fala mal de mim e nunca me defende, mas eu acho que nós temos que respeitar as pessoas que nos ensinaram a trabalhar. O chef francês que me ensinou a ser um bom cozinheiro, era pior do que eu, mas eu nunca vou falar mal dele. Ninguém queria trabalhar com ele. No começo, eu o achava maluco. Mas eu me dei bem com ele, trabalhamos juntos por seis anos. Eu aprendi muito, muito.


fonte: http://epocanegocios.globo.com/Informacao/Visao/noticia/2014/10/eu-nunca-mais-vou-assinar-uma-carteira-de-trabalho-na-vida.html

segunda-feira, 23 de fevereiro de 2015

As Atividades Culturais Literárias


O que um escritor deve fazer para ser conhecido? "Vender livros"! Ok, mas por que será que um escritor não vende livros? "Talvez seja porque ninguém o conheça". Então, o que um escritor deve fazer para vender muitos livros? "Ser conhecido". E o que ele deve fazer para se tornar conhecido? Escrever.
É, está um circulo vicioso mesmo, mas você precisa aquecer o seu nome no mercado literário, se realmente quiser fazer parte dele e obter reconhecimento, respeito e em decorrência disso, retorno financeiro. Um escritor deve escrever. E muito. É difícil de acreditar, mas existem escritores que não possuem blog. Escritores que não participam de nenhuma rede social. Não dá! O escritor precisa ter um elo de sintonia
com o seu público em potencial. O povo virtual que irá o acompanhar literariamente e comercialmente. Todos estão na internet. Os leitores pesquisam tendências comerciais literárias através de blogs e páginas sobre livros. Você precisa entrar mais em sintonia. Faça logo um blog e trate de atualizá-lo, sempre postando seus pensamentos, opiniões e ideias. Porque quando você tiver o seu livro para publicar, eles vão saber e compartilhar. O escritor também precisa de reconhecimento acadêmico. Academias de letras regionais estão abertas para a admissão de novos escritores. Filie-se em sua cidade e/ou Estado. Participe de antologias, publicações, festivais, recitais, cerimônias e outras atividades culturais literárias, sejam elas presenciais ou virtuais. O seu nome ficará destacado em todo o local, além de servir de referência e
biografia para futuros projetos e atividades. E em falando em projetos, como está a sua dedicação literárias nos projetos culturais em sua cidade? Você está em sintonia com o que acontece na Secretaria de Cultura? Participou da última cerimônia aberta na câmara? Assinou o livro de presença em algum evento cultural da cidade? Já visitou alguma escola? Pois é, essas coisas são importantes. Não queira explorar mundos literários longínquos sem antes conferir o que acontece em seu próprio lar cultural.
Eles precisam de você e não tenha dúvida que terá o apoio e respeito deles.

Leo Vieira

O que vende mais atualmente?


É o tipo de dúvida intrigante para quem quer faturar no mercado literário. Mas o conselho é: Nunca pense em escrever de acordo com o que vende na atualidade. Na onda dos romances "vampirescos" liderados por Stephenie Meyer, existem mais de quarenta títulos com o mesmo enredo de romances proibidos protagonizados por meninas insossas que se apaixonam perdidamente por rapazes estranhos e misteriosos até virem à tona a "surpresa" de que eles são... vampiros!
É um clichê irritante demais. Não quero julgar que são ruins, afinal eles fazem o bom papel de entretenimento juvenil. Muitas editoras vão na onda, até mesmo copiando o modelo de capas de fundo preto com efeitos misteriosos. Realmente podem vender, assim como livros de zumbis e também de romances polêmicos sadomasoquistas. A questão é: será que vale a pena apelar para um clichê somente para vender bem?
Isso é um erro muito grave para quem quer se aventurar respeitosamente no mercado literário. Não escreva para vender, porque o seu público notará isso. Seja original em sua história. Vampiros são seres sanguinários, violentos, cruéis, demoníacos, soturnos, macabros e desprovido de sentimentos. Na mesma linhagem maligna estão os demônios e os zumbis. Então não tente apelar para os clichês controversos de vampiros e zumbis românticos com missão especial com meninas adolescentes, a não ser que seja algo totalmente original, porque você irá começar mal.
Respeite a inteligência do leitor, porque ele é exigente e se ele der ao luxo e confiança de apostar em uma literatura nova, então aproveite esse momento com todo o seu empenho. Apresente uma obra original e contundente. Faça o leitor pensar e ter vontade de reler e compartilhar a novidade. São muito poucos os que realmente pensam assim e colocam em prática no início de sua trajetória.

Leo Vieira

segunda-feira, 16 de fevereiro de 2015

a ideologia de um cinema falsamente ingênuo



Gaetano_Previati_-_Il_bacio.jpg






Este artigo deseja mostrar que filmes inteligentes podem estimular
novas atitudes, pensamentos e sentimentos enquanto filmes aparentemente
bobinhos podem manipular as pessoas no sentido do consumismo , dos
preconceitos e dos tabus.




O cinema comercial americano nos induz a modelos idealizados.



Sou suspeita para falar sobre cinema americano pois fiz uma opção
sentimental e intelectual pelo europeu há anos luz. Isso não quer dizer
que os Estados Unidos não possuam grandes diretores e filmes memoráveis.
Muitos destes grandes diretores afirmam se inspirar em cineastas
europeus. E grande parte dos filmes mais irreverentes e subjetivos
criticam ferozmente o American way of life. Basta pensarmos em exemplos
não tão antigos como Pequena Miss Sunshine ( 2006) e Beleza americana (
1999). O primeiro questiona o sentido de ser fracassado em uma sociedade
que divide as pessoas entre vencedoras e perdedoras. Tal linha de
pensamento é conduzida por um personagem especialista em Marcel Proust ,
complexo escritor francês que teve uma vida de fracassos para os
padrões vigentes das sociedades capitalistas.


Abigail_Breslin.jpg
Abigail Breslin, protagonista de "Pequena Miss Sunshine".






Em Beleza americana o personagem vivido por Kevin Spacey afirma que o
melhor momento do seu dia é quando ele se masturba. Neste filme , mais
um retrato feroz do American way of life, todos usam máscaras. Ninguém é
realmente o que aparenta ser. A loira sexy na verdade é virgem. A
personagem vivida por Annette Bening , esposa de Kevin Spacey , esconde
atrás da sua motivação histérica a categoria mais deprimente de
fracassada. O vizinho machão e homofóbico na verdade é um gay reprimido.
Poderia citar muitos outros exemplos de filmes estadunidenses que
quebraram protocolos ; que questionaram o sistema e encantam com o senso
de realidade e trazem à tona a necessidade de entender o cinema como
algo que extrapola o mero entretenimento. A maioria assiste a filmes
para sonhar. Alguns poucos assistem para acordar. Porém, a maioria das
produções são para ganhar dinheiro mesmo.


Hlediště_kina_Světozor_při_zakončení_festivalu_Mezipatra_2007.jpg


No entanto, falar que muitos filmes servem apenas para entreter ,
não significa dizer que tais obras são ingênuas ideologicamente falando.
Alguns filmes extremamente comerciais e aparentemente “bobinhos” ;
feitos apenas para rir , chorar ou dar medo, carregam uma ideologia
pesadíssima e perigosa, pois diferentemente do cinema independente e de
arte que nos convida a refletir , o extremamente comercial apresenta
todas as suas verdades como inquestionáveis. Vamos a um exemplo? A
mentira ( 2010) . Nome bem sugestivo. O filme fala sobre uma garota
recatada que quer se passar por uma devoradora de homens. Mais uma vez a
questão das máscaras para parecer bem sucedido em uma sociedade com
valores materialistas. Mas o grande problema deste filme se concentra na
personagem vivida por Lisa Kudrow , a atriz que interpretou por dez
anos a insólita e carismática Phoebe no seriado Friends. Lisa Kudrow
interpreta em A mentira uma diretora de escola que se envolve
sexualmente e afetivamente com um aluno. Mas o filme mostra apenas o
lado sexual da relação, ignorando a complexidade de um caso entre
professor/aluno.


Situação semelhante foi apresentada no filme The English teacher ,
traduzido para o Brasil como Adorável professora , estrelado pela
talentosíssima Julianne Moore. Na visão destes filmes, professoras e
diretoras que se envolvem com estudantes agem como loucas surtando ou
transmitem doenças venéreas porque são promíscuas e asquerosas. A
diretora vivida por Lisa Kudrow contaminou o aluno. A professora de
Julianne Moore tem relações sexuais com o estudante em plena sala de
aula e depois adota um comportamento transloucado. Se formos comparar
estas duas obras com o filme inglês Notas sobre um escândalo ( 2006)
veremos que a personagem da professora que comete a transgressão é um
ser humano completo, denso, que sofre e se sente sozinha. O seu erro não
a transforma em uma louca ou em uma mulher promíscua.


Até os filmes de terror não fogem à ideologia. Em obras como
Sexta-feira 13 , a mocinha boazinha , que gosta de crianças, boa filha e
recatada nunca morre. São brutalmente perseguidas , mas no final,
sempre acontece alguma coisa; sempre chega alguém que as salva. Em
filmes como os do diretor italiano Mario Bava qualquer um poderia
morrer: bonzinhos e mauzinhos; recatadas e taradas.


La_Maschera_del_Demonio.png
Barbara Steele em "A máscara de Satã" , do italiano Mario Bava.








O cinema comercial estadunidense aparenta ser o que menos ensina. Mas
provavelmente é o que mais ensina; é o que mais fornece lições de moral
fechadas. Lições adequadas aos interesses de um sistema que prioriza o
sucesso e não a felicidade.


Grande parte da produção comercial americana se dedica a fazer
historinhas aparentemente bobinhas , mas que na realidade colocam os
Estados Unidos como os mocinhos do mundo e seus inimigos como os vilões.
Durante a Guerra Fria , que se estendeu do fim da Segunda Grande Guerra
até a queda do Muro de Berlim ( 9 de novembro de 1989) muitos filmes
mostraram os países da extinta União Soviética como os vilões do mundo.
Por exemplo: O Franco atirador ( 1978). Confesso que me deixei levar por
este filme esteticamente comovente. Mas na cena final, quando os
personagens cantam o hino dos Estados Unidos , senti uma cortina ser
aberta e pude ver os atores demaquilados. Percebi que na realidade o
filme era uma propaganda americana. Os Estados Unidos nunca engoliram
perder para o Vietnã e atribuíram aos soldados rivais uma crueldade
exclusiva, que na verdade existe em todo povo que vence.


Táxi Driver de Scorsese foge à regra. Neste filme , um veterano da
guerra do Vietnã salva uma garota da prostituição, deixando um enorme
rastro de sangue. A família da garota e a sociedade agradecem. Por outro
lado o personagem nos parece o tempo todo desajustado. Enfim, o filme
não fornece uma resposta fechada , o que o torna no mínimo muito
interessante.


Travis_Bickle.png
Robert De Niro em "Taxi Driver" , de Martin Scorsese.








Esta relação maniqueísta ainda vigora no cinemão americano. Eles
continuam como os mocinhos. Agora os vilões são outros. Durante toda a
sua trajetória, o cinema comercial americano funcionou e funciona como
um instrumento de persuasão ; uma máquina de fazer ideologia disfarçada
de indústria do entretenimento. Consideramos quase todas as culturas não
ocidentais estranhas e brutais porque as conhecemos por meio de jornais
e filmes comerciais , veículos nem sempre preocupados em se aprofundar
no sentido antropológico da palavra. Sabemos fatos , costumes. Mas não
entendemos os porquês. Julgamos o outro por meio de nossos critérios.


Somos estimulados a repetir padrões comportamentais que nos fazem
sofrer e nos roubam a espontaneidade para nos encaixarmos em um pseudo
modelo de sucesso, que nada tem a ver com felicidade no sentido mais
genuíno da palavra. As comédias românticas induzem às mulheres a
esperarem por um tipo de relacionamento idealizado , o que faz muita
gente sofrer demais. O dinheiro, o poder e a beleza são supervalorizadas
; a sexualidade é tratada como um tabu; o consumismo é estimulado. Por
tal razão é muito enriquecedor assistir a todo tipo de filme e entrar em
contato com fontes de conhecimento variadas. Desta forma, poderemos
construir nossas próprias opiniões com um olhar mais abrangente.





a ideologia de um cinema falsamente ingênuo

Carreira Básica ou Literária?


O mercado literário é escorregadio, disputado e também decepcionante, se você realmente quer saber mais, antes de se aventurar nele. Pode ser que essa classificação não seja muito agradável logo de início, mas é o mais importante que você descubra até mesmo para que saiba o que realmente espera conseguir através dele.
Você escreveu, tem o seu livro e decide enfim publicá-lo. Sua mãe e seus amigos elogiaram e disseram que você devia se tornar escritor. Isso aí não basta. Preste bem a atenção nesses momentos, se você realmente quer se aventurar ou apenas massagear o seu ego com uma publicação. Os críticos literários não vão passar a mão na cabeça de ninguém, ainda mais quando se é um autor iniciante.
Se a carreira literária que você escolheu é apenas "vamos ver no que vai dar", então será muito simples; é só providenciar o registro na Biblioteca Nacional, revisão, diagramação, capa e encomendar um tiragem pequena em uma gráfica ou editora por demanda, com ISBN, código de barras e ficha catalográfica. Faça uma reunião com amigos em uma biblioteca ou pizzaria e convide um fotógrafo de um jornal para fazer
uma foto e uma nota no jornal local. Você venderá uns quinze exemplares no dia (o que já é ótimo, porque garantirá o retorno do que investiu na impressão). O resto você poderá vender nos anúncios no blog.

Agora, se você quer construir uma carreira literária, o caminho será mais espinhoso. Você terá que adotar alguns métodos e o investimento será maior também. Nas postagens seguintes, apresentarei métodos essenciais para que seu nome fique realmente reconhecido e respeitado no mercado cultural literário. Não tenha pressa e seja sábio na caminhada, porque o sol ainda ilumina espaço para todos.

Leo Vieira

sábado, 14 de fevereiro de 2015

O culto do multiculturalismo





 
Rodrigo Constantino
 

“Uma cultura só tem importância se for boa para os indivíduos”. (Kwame Anthony Appiah)


Uma das maiores ameaças à liberdade
individual atualmente encontra-se no culto do multiculturalismo. Vários
autores notaram este risco, entre eles Thomas Sowell, da Escola de
Chicago. Em sua coletânea de textos Barbarians Inside the Gates,
Sowell lembra que o mundo sempre foi multicultural, por séculos antes
de o termo ser cunhado. Tratava-se de um multiculturalismo num sentido
prático, diretamente oposto ao que o atual culto dos relativistas
culturais prega. Como exemplos, Sowell lembra que o papel onde seu livro
foi escrito fora inventado na China, as letras vieram da Roma antiga e
os números da Índia, através dos árabes. O autor é um descendente da
África, que escrevia enquanto escutava música de um compositor russo.
A razão pela qual tantas coisas se
disseminam pelo mundo todo está no simples fato de que algumas coisas
são consideradas melhores que outras, e as pessoas desejam o melhor para
si. Esta obviedade é justamente o contrário do que o credo do
multiculturalismo atual defende, alegando que nada é melhor ou pior, mas
“apenas diferente”. Na verdade, as pessoas mundo afora não apenas
“celebram a diversidade”, elas escolhem aquilo de sua própria cultura
que desejam manter e aquilo que preferem abandonar em prol de algo
melhor vindo de fora. Quando os índios americanos, por exemplo, viram os
cavalos dos europeus, eles não se limitaram a “celebrar a diferença”,
eles começaram a montar em vez de ir andando. À contramão do que o culto
do multiculturalismo defende, as pessoas não buscam viver “em harmonia
com a natureza”, e sim obter o melhor que puderem. Eis o motivo pelo
qual, desde automóveis até antibióticos, os bens demandados se
espalharam pelo mundo. Não importa o que os filósofos do
multiculturalismo dizem, é isso que milhões de pessoas fazem.
Para Sowell, este tipo de
multiculturalismo moderno é uma dessas afetações que algumas pessoas
podem se dar ao luxo de ter enquanto estão usufruindo de todos os frutos
da tecnologia moderna. Normalmente não são pessoas pobres vivendo em
países muito atrasados que bradam sobre as “maravilhas” das diferentes
culturas. São “intelectuais” de países desenvolvidos que olham com
desdém para os processos que tornam possível a produção de todo tipo de
conforto que desfrutam.
Uma cultura é, segundo a definição da Enciclopédia Britânica,
um padrão integrado de conhecimento humano, crenças e comportamentos
que são resultados da capacidade humana de aprendizagem e transmissão de
conhecimento para as gerações seguintes. Cultura consiste então em
língua, idéias, crenças, costumes, códigos de conduta, instituições,
ferramentas, técnicas, rituais, arte, símbolos etc. A cultura de um povo
pode evoluir com o tempo. Cultura se aprende. Os relativistas culturais
tentam logo acusar de “nazistas” aqueles que conseguem enxergar
objetivamente instituições e costumes superiores – ignorando que Hitler
falava em superioridade racial dos arianos, algo que seria inato, não
aprendido. O conceito de raça humana sequer faz muito sentido. Já
estoque de conhecimento, instituições, valores e avanços não só existem e
variam muito de cultura para cultura, como uns são bastante superiores a
outros. Ou será que alguém realmente acredita que a cultura da Suíça é
apenas “diferente” daquela existente no Zimbábue, e não melhor? Será que
os costumes de sacrifício infantil praticados pelos incas seriam
atualmente vistos como “apenas diferentes” pelos relativistas culturais?
Como conciliar isso com a demanda por um código de direitos humanos
universais?
Algo inerente aos relativistas culturais,
pelo fator contraditório de suas crenças, é o constante uso de dois
pesos e duas medidas. Ao mesmo tempo em que relativizam todas as
barbaridades provenientes da cultura atrasada que pretendem defender,
esquecem o relativismo e partem para a objetividade de julgamento na
hora de condenar as culturas que detestam – normalmente as mais
avançadas e livres. Assim, cortar o clitóris passa a ser apenas uma
“diferença cultural”, como colocar um brinco na filha. Mas o
“consumismo” ocidental é algo podre, que deve ser combatido, e não
apenas uma “diferença” de valores. Uma cultura que prega a morte de
“infiéis” é apenas uma cultura “diferente”, enquanto se um país for se
defender dessa ameaça, sua “cultura belicosa” passa a ser repugnante. Os
relativistas fingem não perceber que se “tudo vale”, porque nenhuma
cultura é superior a outra, então um povo pode alegar ter como valor
supremo em sua cultura o extermínio de outras culturas. Com qual
critério objetivo um relativista consegue julgar algo, se tudo não passa
de “diferenças culturais”? Quando os relativistas culturais alegam, por
exemplo, que nenhuma cultura está num estágio inferior e que seus
costumes são “apenas diferentes”, estão sendo coniventes com a prática
nefasta de matar por apedrejamento uma mulher cujo único “crime” foi ter
cometido adultério. Queiram ou não, o fato é que os adeptos desse culto
do multiculturalismo são cúmplices dessas barbaridades.
O filósofo Kwame Anthony Appiah explicou
de forma bastante objetiva os riscos da visão coletivista da cultura, em
detrimento ao direito de livre escolha individual. O autor, nascido em
Gana, é Ph.D. pela Universidade de Cambridge e lecionou em Harvard e
Princeton, além de autor do livro Cosmopolitanism, onde defende que a
globalização fez bem às culturas regionais. A globalização não
uniformiza, diversifica. A reclusão é que exaure a inspiração. Culturas
fechadas estão fadadas ao insucesso. Basta comparar a diversidade nos
Estados Unidos, com inúmeras culturas diferentes convivendo lado a lado,
com a maior homogeneização de uma Coréia do Norte, isolada do mundo.
A população deve ter a liberdade de
escolha de quais produtos culturais deseja consumir. Appiah dá o exemplo
das camisetas que os africanos usam, deixando de lado suas roupas
coloridas tradicionais. Se as camisetas cumprem a função de cobrir o
corpo e são mais baratas, que mal há em deixar as vestes tradicionais
para ocasiões especiais apenas? Tirar o direito de escolha dos
indivíduos em nome da “preservação cultural” beira o desumano, e
normalmente quem pensa assim está longe, no conforto justamente de
culturas mais liberais. O mesmo vale para o resto dos produtos
existentes. Os indivíduos devem ser livres para decidir qual filme
desejam assistir, quais músicas querem escutar ou qual comida pretendem
comer. Quanto mais liberdade de mercado, com abertura para diferentes
países e culturas, maior o número de opções disponíveis. Appiah chama de
“preservacionistas culturais” aquelas pessoas com bom padrão de vida em
algum país ocidental, normalmente, que olham para as culturas
diferentes e exóticas como algo interessante, bonito, que deveriam ser
mantidas para sempre da mesma forma. Mas, como Appiah diz, “se o costume
é ruim para o bem-estar de uma grande parcela daquela população, o fato
de fazer parte da cultura não é motivo para insistir no erro”.
O foco deve ser o indivíduo e sua
liberdade de escolha, não a tribo, a nação ou a cultura. A cultura não é
um fim em si, mas um meio para a felicidade dos indivíduos. E cada um
deve ser livre para escolher como quer buscar sua felicidade. Eis
justamente o que o culto do multiculturalismo deseja impedir.

Texto presente em “Uma luz na escuridão”, minha coletânea de resenhas de 2008.




O culto do multiculturalismo | Rodrigo Constantino - VEJA.com

terça-feira, 10 de fevereiro de 2015

O que falta ao mercado de quadrinhos no Brasil

Um dos mais famosos quadrinistas brasileiros,
Marcello Quintanilha, defende a volta das revistas comerciais, críticos
mais analíticos e um esforço maior dos artistas em atrair público




Marcello Quintanilla (Foto: Divulgação)
Marcelo Quintanilha
Unir suspense, diálogos coloquiais, tipos populares em uma arte - e traço - extremamente realistas fez de Tungstênio um dos HQs mais bem avaliados de 2014 no Brasil e no exterior. Trata-se da primeira graphic novel
de Marcello Quintanilha, um dos mais famosos quadrinistas brasileiros.
Ele, que vive na Espanha desde o início dos anos 90, quando foi ser
colaborador de uma revista belga, gosta mesmo de retratar o cotidiano
brasileiro. Gosta dos sem-grana, do ex-sargento de Salvador, dos amores
do subúrbio e do motorista do busão. "Todo o meu universo temático diz
respeito exclusivamente à vida que eu conheci no Brasil".

Nascido em Niterói, em 1971, Quintanilha começou a carreira em 1988,
ilustrando revistas de terror e artes marciais, vendidas a preços
populares em bancas. Seu primeiro trabalho autoral é de 1991, chamado
"Acomodados! Acomodados!". A história venceu a 1ª Bienal de Quadrinhos
do Rio de Janeiro naquele ano. Obteve maior visibilidade e alcançou mais
leitores com a publicação do livro Sábado dos Meus Amores. Depois, ilustrou a seção de quadrinhos e crônicas do jornal O Estado de S. Paulo, e a adaptação do clássico de Raúl Pompeia, O Ateneu, até ir morar em Barcelona e, de lá, também colaborar com publicações como o El País e a revista La Vanguardia.

Ao mesmo tempo em que sua carreira sobreviveu a momentos duríssimos do
mercado de quadrinhos brasileiro no final dos anos 80, ela também lhe
trouxe a chance de  ter contato lá fora com o que há de melhor nas
gibiterias espanholas e lojas europeias. Nos últimos anos, seus
trabalhos ganharam força no mercado brasileiro, que cresceu, evoluiu e
hoje conta com editoras especializadas, eventos gigantescos e um público
que extrapolou os pequenos nichos. Mas o Brasil ainda caminha devagar.



Para Quintanilha, o boom atual dos quadrinhos por aqui não é
necessariamente um sinal de que o mercado se fortaleceu. "A consolidação
dependerá do quanto os produtores serão capazes de ampliar a parcela do
público interessada em quadrinhos e do quão capazes seremos nós,
artistas, de conquistar novos públicos", afirmou. Em entrevista à Época
NEGÓCIOS, Quintanilha comenta sobre a evolução gráfica e comercial dos
quadrinhos brasileiros, de que forma a decadência das bancas afeta esse
mercado e como é seu processo criativo:

Como você analisa a cena atual do mercado de quadrinhos no Brasil? 

Vejo hoje uma multiplicação de publicações que não chegava nem perto de
quando comecei. Quando comecei, esse mercado vinha de um refluxo
editorial, havia enfrentado crises econômicas e sofrido com as políticas
monetárias. O quadrinho sentiu muito tudo isso. Mas vejo hoje que isso
não só foi recuperado como o quadrinho adquiriu outro tipo de
visibilidade e impulso. Há leis de incentivo e há a internet, que é um
veículo que traz muita exposição para novos autores. Nesse sentido,
atualmente, o panorama é muito melhor do que era há alguns anos. Mas há
um longo caminho ainda a percorrer. É preciso que esse mercado se
consolide, é preciso buscar ampliar o público e ter um público
consumidor mais presente. É este o grande fator que diferencia os
mercados mais estabilizados (Europa, Japão) do mercado brasileiro. Vejo o
momento atual como parte de um processo que, lamentavelmente, foi
interrompido muitas vezes. Então apesar de toda essa movimentação atual
no cenário de quadrinhos o que vai definir se o mercado brasileiro se
consolidará é a evolução desse processo atual.

O que é necessário para essa evolução ocorrer?

A manutenção dos fatores atuais: editoras realmente investindo em
quadrinhos, estímulo e público para eventos, feiras, festivais. É
fundamental que as histórias produzidas no Brasil adquiram outro
patamar, subam de qualidade, tragam mais profundidade. Essa consolidação
depende do quão capazes serão os produtores de ampliar a parcela de
público interessada em quadrinhos; o quão capazes seremos nós, artistas,
de conquistar novos públicos.



Em termos editoriais e gráficos, podemos falar em uma evolução dos quadrinhos brasileiros?

As publicações têm melhorado e ganhado qualidade. O quadrinho autoral,
por exemplo, é o que tem adquirido mais destaque, e as sucessivas
publicações deixam evidente que ele está em pleno processo de
desenvolvimento e consequente amadurecimento. Há muito incentivio e
algumas editoras interessadas em explorar esse campo. Mas, em
contrapartida, tivemos uma completa decadência das revistas comerciais.
Quando comecei minha carreira, foi desenhando histórias de terror e
artes marciais que saíam na banca com periodicidade mensal. Hoje, não
temos mais revistas de consumo: de aventura, terror, policial. Em
qualquer um dos principais mercados mundiais de quadrinhos, as
publicações de gênero respondem pela maior parcela do mercado, fazendo
com que o quadrinho autoral gire em torno desse núcleo.

De que modo a falta desse tipo de publicação [de gênero] prejudica o mercado brasileiro?

Seria um fator que contribuiria para a consolidação do mercado. O fator
comercial é essencial para o mercado. E, com isso, eu não quero dizer
que histórias autorais não são comerciais. É que se comercializa de
maneiras diferentes. Um quadrinho autoral, normalmente, vai ser focado
em determinado número (pequeno) de exemplares e para determinado tipo de
público. Enquanto os para consumo maior, terão outro tipo de
tratamento, outra tiragem. A questão é que quadrinhos autorais têm
seguido um caminho no Brasil, enquanto outras publicações de gênero não
tem seguido caminho nenhum.

O Gabriel Bá afirmou recentemente que os quadrinhos
independentes no Brasil estão ficando cada vez melhores, ao mesmo tempo
em que ficam mais caros e as tiragens continuam as mesmas. Para ele,
está está cada vez mais difícil encontrar fanzines baratos, porque todo
mundo já parte para revistas sofisticadas. Você concorda?


Acho que é uma parte de um processo natural que ocorre no mundo todo.
As revistas decaíram. A cultura de banca se perdeu muito. Na Espanha,
nem se compra mais em banca. Os quadrinhos migraram – aqui há centenas
de gibiterias, que vendem revistas de gênero, consumo e autorais. Com as
lojas especializadas de quadrinhos, as revistas passam a ser tratadas
de outra forma. Além disso, nos últimos anos vimos uma evolução enorme
do processo produtivo que levou a um salto qualitativo visual: do papel
às cores. Isso acaba encarecendo o produto e fará com que,
inevitavelmente, o público fique limitado. Esse processo, que ocorre
agora no Brasil, não é um privilégio do Brasil. Já aconteceu em todos os
países de mercado consolidados.

Qual é o papel da crítica especializada de quadrinhos? Em que
medida, tanto os veículos maiores quanto blogs especializados, conseguem
atrair mais público e impactar as vendas? 


Eu vejo uma particularidade em relação à forma como o quadrinho é
apresentado ao grande público. Vejo que uma imensa parcela de críticos
se auto impõe a responsabilidade não de depurar a diversidade de
material que chega até os leitores, mas, sim, promover a linguagem do
quadrinho enquanto produto. Parece que o objetivo não é analisar, mas
trabalhar a favor da ampliação do público consumidor. O resultado disso,
se pensarmos em um público cujo contato com o quadrinho é pequeno ou
mesmo nulo, pode ser justamente o contrário do pretendido, já que
ocorrerão distorções que valorizam de modo de modo excessivo apenas
trabalhos medianos, ou até abaixo disso.

Pensando em ser quadrinista profissional, qual é a perspectiva
que hoje um jovem brasileiro pode ter? Comparando com a época que você
começou é mais fácil?


É diferente. Eu trabalhava em uma editora que tinha uma proposta
editorial e tive que me adaptar àquele tipo de proposta. Já hoje, a
perspectiva que os jovens e artistas têm, é que você é quem vai
formalizar a sua proposta e apresentar à editora ou buscar um
financiamento colaborativo, por exemplo. No caos do Brasil, é melhor
trabalhar desse segundo jeito. Porque a única editora que tem um estúdio
com uma proposta clara é a do Mauricio de Sousa. Não acho que é fácil.
Se você está inserido no mercado norte-americano, por exemplo, dá para
viver disso desde cedo. Porque é um mercado, assim como o europeu, muito
massificado. Existe um consumo muito grande de quadrinhos nesses
países. Editoras podem assumir contratos financeiros diversos e artistas
podem sobreviver só disso.

Trecho de Tungstênio: Quintanilla descrever Richard, um policial de Salvador que vive entre dilemas, mas não hesita em agir (Foto: Divulgação)
Você é reconhecido como um ótimo cronista, mas em críticas
recentes muitos jornais afirmaram que seu desenho e traço têm até se
destacado mais.  Como você descreveria o seu processo criativo? A
história é aleatória e o desenho a acompanha?


Eu realmente deixo as coisas acontecerem. Sei que isso não é usual no
mundo profissional, mas é como venho trabalhando. E as histórias são
muito consistentes justamente devido a isso. Quero dizer que o tempo que
é necessário para criar uma história não é algo contabilizável. Eu
posso terminar histórias em um espaço curto de tempo ou demorar anos.
Mas sei que tenho certa liberdade nesse aspecto devido às editoras com
as quais trabalhos – onde tenho confiança e liberdade. Muitas editoras
trabalham com prazos mais apertados e exigem dos artistas uma adaptação a
suas propostas. Meu trabalho não está vinculado a nenhum tipo de
proposta editorial que venha a ser colocada no mercado por alguma
editora. É uma diferença substancial. Eu desenho de todas as formas e
cada história tem um processo criativo diferente. Há histórias minhas em
que comecei desenhando e criando um pequeno storyboard e só depois fiz
os textos. Porque em alguns momentos simplesmente eu podia não ter
história. É válido não seguir caminhos – começar a desenhando e ver o
caminho que eles te levam. Agora, por exemplo, no caso do Tungstênio, eu
tinha uma história – que ouvi no rádio – e já criei com começo, meio e
fim.

Você comentou recentemente que não sentia saudades do Brasil,
porque você trouxe o Brasil inteiro com você quando foi para a
Barcelona. Em Tungstênio, a gente vê um retrato muito próximo do
brasileiro, dos 'heróis do cotidiano', daqueles que geralmente não são
os protagonistas. Qual é o Brasil que te inspira?


Infelizmente, muitas das coisas que me encantaram e com as quais
mantenho uma relação nostálgica não existem mais. É o bairro operário de
Niterói onde nasci, o Barreto, é crescer nos anos 70 em um local que
enfrentava um grande processo de deterioração. O apogeu ali já havia
passado há duas décadas, mas todo o universo operário estava ainda muito
presente. Isso me afetou de maneira fundamental, passou a ser a chave
com a qual eu pude formalizar meu trabalho. Um trabalho que dialoga com
as coisas simples, da vida cotidiana.

É essa a maior inspiração do seu trabalho?

Sim. Mas muitas das coisas nas quais me inspiro eu não presenciei
necessariamente. Eu trabalho a partir do que tenho comigo, do que penso,
não sinto essa distância. Meu trabalho não é presencial. Eu não
acredito na banalidade em si. Eu acredito na mítica do dia qualquer, em
que qualquer coisa pode acontecer. Eu nunca acreditei nisso [que alguém
tinha que falar o que fazer] e eu não acredito que seja possível pensar
isso para ninguém. Simplesmente porque minha forma de trabalhar nunca
foi para as editores, foi para os leitores. Quero buscar comunicação. É
isso o que mais me interessa quando faço quadrinho. Busco me comunicar
com o maior número de pessoas possível.














fonte: O que falta ao mercado de quadrinhos no Brasil | Época NEGÓCIOS - notícias em Visão