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quarta-feira, 14 de março de 2018

Revista AVL em Revista

Revista AVL em Revista - A revista digital da Academia Virtual de Letras António Aleixo.




A Revista AVL em Revista Ano III, nessa edição de número 1, vem trazendo textos, artigos, crônicas, contos, entrevistas e poemas dos seus acadêmicos num formato compacto de 30 páginas. Leiam e apreciem!!! Um por todos e todos pela poesia!!!

Link para acessar a revista: 

sexta-feira, 3 de março de 2017

Crise nas livrarias: Insistindo no erro até encontrar o fracasso

Haroldo Ceravolo Sereza*, 02/03/2017
A Livraria Cultura do Conjunto Nacional, em São Paulo | ©Divulgação
A Livraria Cultura do Conjunto Nacional, em São Paulo | ©Divulgação
Vamos dar uma volta antes de falar da crise das livrarias? Acho que vale a pena.


Essa história é de quando eu trabalhava n’O Estado de S. Paulo,
no começo dos anos 2000. Poucos anos antes a direção do Jornal da Tarde
implementou um modelo de fazer jornalístico que exigia a figura do
“personagem”. No jargão jornalístico, “personagem” é uma pessoa comum
que “encarna” a notícia. Por exemplo, se há um crescimento no número de
pessoas que estudam japonês na cidade, o “personagem” a ser apresentado é
um típico paulistano da Mooca, preferencialmente com sotaque italiano,
que gosta de ler mangás originais. Ele vai explicar porque acha
importante ler mangá. A notícia ideal nesse modelo não é “cresce o
número de escolas de japonês” em São Paulo, mas “Antonio Carcamano está
aprendendo japonês para ler mangás”. Se a inflação está crescendo por
causa dos hortifrútis, a “personagem” é a dona de casa que está parando
de comprar tomates por causa do preço. E por aí vai.


Parece bacana, né? Mas pense num jornal inteiro assim: fica repetitivo, superficial e, quase sempre, preconceituoso.


Bom, o fato é que a direção do Jornal da Tarde aproveitou um
momento de crescimento e apostou no modelo. Os mais animados falavam em
“new jornalism”, os mais burocratas gritavam aos repórteres: “Cadê a
personagem?! Eu quero a personagem”. Passados alguns meses, resolveram
fazer uma pesquisa sobre o que pensava o leitor. E a resposta foi
bastante simples: aquela história de personagem estava enchendo o saco:
os cadernos que haviam mergulhado no projeto eram os mais mal avaliados.


A direção do jornal não recuou. Insistiu no projeto. O resultado
prático? Bom, muita gente vai dizer que foi a internet que acabou com o
Jornal da Tarde, outros dirão que o Estadão nunca deixava ele crescer.
Mas o fato é que o Jornal da Tarde não existe mais...


Acabou a historinha. Vamos às notícias.


Comecei falando de jornalismo, mas eu queria mesmo é falar da
crise que as grandes redes de livraria estão vivendo. Duas notícias de
impacto recentes: a Saraiva estaria negociando a aquisição de ações da
Cultura (ou fusão com, como preferem alguns) e a Fnac está decidida a
deixar o Brasil.


Essa crise é uma bola cantada. Muita gente vai culpar a Amazon,
mas vamos pensar os casos isoladamente. As dificuldades da Cultura são,
de fato, as mais difíceis de lidar. Isso porque ela é, ainda, um canal
importante de venda de livros e está na memória afetiva de todo leitor
paulistano. Quem não comprou livros lá certamente desejou isso.


Quem acompanha o mercado há alguns anos sabe que o modelo de
crescimento da Cultura baseou-se em um tripé: abertura de lojas em
profusão (inclusive com financiamentos do BNDES), imposição de condições
cada vez mais duras aos fornecedores (ampliação do desconto e dos
prazos de pagamento) e venda de espaços nas lojas.


A venda de espaços começou quando eu ainda era apenas jornalista.
Foi adotada por Saraiva, Nobel e Laselva. A Cultura negava. Um dia
liguei para a Cultura, porque me chegara por e-mail sobre as condições e
preços das vitrines. A Cultura negou tudo. Disse que era mentira, que o
e-mail era falso. Deixei o jornal antes de a matéria ser concluída, mas
pouco depois a mesma apuração foi feita pela Folha, por outro repórter.
Nela, Pedro Herz, o dono do negócio, reconheceu o que dizia que não
existia e tratou como algo “normal”.


A reação da Cultura a meu telefonema mostrava que era incerto
aquele caminho. A livraria sempre se pautara por ser uma referência não
só comercial, mas também cultural. Quando a vitrine passa a ser
organizada não de acordo com o interesse cultural ou comercial imediato,
mas na lógica do marketing, a aura da Cultura começava a se perder.


Mas isso faz mais de treze anos. O processo de mercantilização da
livraria foi lento e progressivo. Em 2010, ajudei a organizar uma
Primavera na Cultura, uma exposição de editores independentes associados
à Libre (Liga Brasileira de Editoras) na rede.


Foi um trabalho pesado de negociação e a conversa, na verdade,
frustrante: não apenas o espaço reservado ficou muito aquém do
inicialmente imaginado, como a conversa de um dos diretores com os
editores, num dos eventos que organizamos, mostrou que as lojas da rede
seriam cada vez menos abertas, na prática, à edição independente. Nunca
mais repetimos o evento.


Anos depois, cheguei a discutir, numa reunião em minha editora,
quando a Amazon ainda ameaçava entrar no Brasil, um projeto de
valorização da bibliodiversidade com representantes da Livraria Cultura.
Não avançaram. A cada nova loja que a Cultura abria, mais distante
ficavam os compradores dos editores independentes. Mais prazo era
exigido e também mais descontos. Havia algo de errado no caminho
escolhido.


Uma visita a meia dúzia de lojas da Cultura mostra outro problema
da rede formada: ela não é homogênea. O problema da rede é que ela se
sustenta como projeto econômico quando a compra é centralizada. Isso
reduz os custos da operação e facilita as negociações com margens
maiores. O problema desse projeto é que ele exige que a ponta também
seja semelhante: o público de uma loja tem de ser parecido com o de
outra, para que a compra centralizada seja acompanhada por um resultado
de vendas positivo em todas as pontas da rede. Mas basta visitar as
lojas dos shoppings Vila Lobos, Iguatemi, Bourbon e Market Place e a
livraria do Conjunto Nacional, todas em São Paulo, para perceber que os
frequentadores são cultural e socialmente diversos o suficiente para não
procurarem os mesmos livros. Imagine então quando estamos no centro do
Rio, na livraria do cine Vitória, ou nas lojas de Fortaleza e Porto
Alegre...


Livraria Saraiva no ostentoso Shopping Higienópolis em São Paulo | ©Leo Neto
Livraria Saraiva no ostentoso Shopping Higienópolis em São Paulo | ©Leo Neto

A Saraiva definitivamente não é minha livraria como consumidor e sequer
vende os livros da Alameda (mesmo no site). A rigor, ela não é uma
livraria, mas uma loja que vende livros, o que parece a mesma coisa, mas
não é. Porém, a seu favor, há uma homogeneidade nas lojas suficiente
para que os mesmos livros fiquem bem confortáveis no shopping
Higienópolis ou West Plaza. Em Brasília, Rio, Salvador: toda vez que vou
a uma Saraiva, sinto que estou num lugar para um público que existe em
todos esses lugares; quando vou à Cultura do Iguatemi, eu não consigo
imaginar como um espaço tão grande pode render, vendendo livros, o
suficiente para se manter. Especialmente para um público que vai ao
shopping para comprar bolsas de milhares de reais – não há livros nesse
preço, como sabemos (caro no Brasil é a bolsa Louis Vuitton,
registre-se).


Ainda não falei sobre a Fnac, talvez porque seja muito difícil
pensar a Fnac hoje como uma livraria. A livraria era apenas um puxadinho
num negócio de venda de aparelhos eletrônicos a preços altos e
qualidade média. Como livraria, que é o que nos interessa, a Fnac sequer
era um negócio: os livros estavam lá talvez por tradição, talvez porque
o modelo foi pensado ou adaptado unindo as duas pontas. Mesmo as
iniciativas culturais, como o prêmio Fnac-Maison de France, foram
escasseando. Assim, a Fnac há muito tempo não era um local de venda a
sério de livros.


As dificuldades dessas grandes redes, por outro lado, são uma
oportunidade para as livrarias independentes. Isso está acontecendo nos
Estados Unidos e pode ocorrer aqui também.


Não se trata, no entanto, de uma tarefa simples. Passa por uma
leitura mais refinada do público frequentador e de como incrementá-lo
organicamente, da manutenção de um acervo e de uma seleção de livros que
seja interessante para o comprador habitual de livros e não apenas para
o leitor de best-sellers (muitas vezes a mesma pessoa, diga-se, mas que
pende um dia para um lado, outro para o outro) e, sobretudo, pela
convicção de que os títulos disponíveis e a informação precisa são mais
relevantes do que um bom café ou um giro de capital rápido, mas infiel.


A livraria como um espaço cultural, com sua lógica tradicional,
de encontro e de surpresa que a internet não pode proporcionar: esse é o
desafio que está posto para quem quer se recuperar e para quem quer se
construir como alternativa.


Evidentemente esse assunto não se esgota assim: a crise é uma
ótima oportunidade também para repensarmos a urgência da lei do preço
único do livro, que as redes tanto bombardearam, criando dificuldades
para si mesmas, que agora se mostram tão explícitas.


Mas esse tema fica para um outro texto.




fonte:  PublishNews

terça-feira, 21 de fevereiro de 2017

Pirataria pode aumentar venda de quadrinhos, diz estudo




Um estudo publicado pelo professor Tatsuo Tanaka, da Faculdade de Economia da
Keio University no Japão, revelou dados interessantes sobre os efeitos
da disponibilidade acesso gratuito sobre o mercado de quadrinhos.
Segundo o estudo, em alguns casos, o acesso a cópias gratuitas dos
quadrinhos pode aumentar a vendagem deles.


Tanaka estudou o efeito da disponibilidade online gratuita dos
mangás, quadrinhos tradicionais japoneses que são lançados de maneira
serial (uma vez por semana, por exemplo). Ao todo, o estudo (pdf)
contabilizou a vendagem de 3.360 volumes de 484 séries diferentes de
mangás ao longo de oito meses.


Esses números não foram incidentais: segundo o pesquisador, as
editoras japonesas de mangás pertencem a um grupo pró-restrição cultural
chamado CODA. Entre julho de 2015 e março de 2016, o CODA promoveu uma
campanha maciça de deleção de cópias digitais ilegais de quadrinhos.
Dessa maneira, a pesquisa pode facilmente comparar a vendagem dos mangás
antes e depois da medida restritiva.


Resultados


Segundo Tanaka, os resultados da comparação foram duplos: para os
mangás que ainda estavam sendo lançados, a disponibilidade de acesso
gratuito a eles pela internet causava uma diminuição das vendas. Por
outro lado, essa disponibilidade fazia com que a venda de mangás que já
haviam se encerrado aumentasse.


Isso poderia, segundo Tanaka, ser devido a um "efeito
publicidade" gerado pela disponibilidade digital dos mangás. Em outras
palavras, o fato de os mangás antigos estarem disponíveis na internet
acaba servindo como "propaganda" para os mangás que já se encerraram.
Nesse caso, o acesso aos quadrinhos acaba reavivando o interesse dos
leitores nele.


Implicações


Para o pesquisador, "um ponto importante que deve ser ressaltado é
a implicação política desse resultado desigual da pirataria. Se o
efeito da pirataria é desigual, desativar os sites piratas de maneira
indiscriminada não é a melhor solução". Isso porque, de acordo com seu
estudo, a "pirataria" pode ajudar a venda de quadrinhos que já se
encerraram.


Tanaka ressalta, no entanto, que não é possível dizer, de maneira
taxativa, se a disponibilidade de acesso gratuito aos mangás é boa ou
ruim para o mercado. Embora o ganho percentual que essa disponibilidade
dê aos quadrinhos antigos seja muito maior que a perda percentual que
ela dá aos quadrinhos novos, em números absolutos a situação é oposta.


Para dar um exemplo com números inventados: um mangá
antigo pode vender 150 cópias em vez de 100 caso esteja disponível
gratuitamente na internet. Por outro lado, um mangá novo pode vender 900
cópias em vez de 1000 caso esteja disponível. Embora o ganho percentual
no primeiro caso seja superior à perda percentual no segundo (+50%
contra - 10%), em números absolutos o ganho no primeiro caso é menor que
a perda no segundo caso.


Outras áreas


O pesquisador ainda diz que há motivos para acreditar que os
efeitos da "pirataria" sobre o mercado de mangás podem ser semelhantes
aos efeitos da "pirataria" em outros mercados. Um estudo citado por ele
revelou que a disponibilidade gratuita de música online diminuiu a
vendagem de discos de artistas populares, mas aumentou as vendas de
discos de artistas menores.


De fato, pesquisas diferentes conduzidas na Austrália e na Suécia
já mostraram que a disponibilidade gratuita de cultura pode aumentar a
quantia que as pessoas investem nesse setor. Esses estudos, que
avaliavam o impacto da "pirataria" sobre os gastos com cultura, revelou
que usuários que consumiam uma mistura de conteúdo legal e ilegal
gastavam mais com esse setor do que os que apenas consumiam conteúdo
legal. 




fonte: 

Olhar Digital

domingo, 1 de janeiro de 2017

Nem a arte visionária nem cultura nenhuma precisa disso



Nem a arte visionária nem cultura nenhuma precisa disso
Adoro a arte psicodélica. Sempre gostei. A cultura psicodélica é fascinante. Estar em viagem sem sair do lugar é tudo o que me restou, sendo medianamente "pobre" de classe média baixa. Eu gostava particularmente da música de Bob Marley e de algumas coisas experimentais do Sonic Youth, gostava de histórias em quadrinhos de Moebius e de arte visionária de Alex Grey, gostava de filmes de Godard e Luc Besson. Ainda gosto. E muito.
 Mas não gosto de ver o que está se fazendo com o braço político da cultura psicodélica ou alternativa ou qualquer que seja a definição que se dê. O libertarismo, usado como trampolim para projeto de poder alicerçado em "benesses" - que de benesse não tem nada - como a liberalização das drogas.
Muitos querem isso e para "isso", vale tudo, até posar de bom moço contra o Donald Trump - outro desgraçado, não tenho nada a favor do Donald Trump pelo contrário - a fim de ganhar votos para um novo partido político, o libertários. Amigos, não se deixem enganar.
Principalmente porque a arte visionária e a cultura psicodélica ou alternativa não precisam disso. Elas tem o seu valor independente de qualquer coloração política. Pense nisso. Paz e luz.

quinta-feira, 7 de maio de 2015

A Arte Contemporânea é uma farsa: Avelina Lésper





Com a finalidade de dar a conhecer seus argumentos sobre os porquês da arte contemporânea ser umaarte falsa“, a crítica de arte Avelina Lésper apresentou a conferência “El Arte Contemporáneo- El dogma incuestionable” na Escuela Nacional de Artes Plásticas (ENAP)sendo ovacionada pelos estudantes na ocasião.
 A arte falsa e o vazio criativo
A
carência de rigor (nas obras) permitiu que o vazio de criação, o acaso e
a falta de inteligência passassem a ser os valores desta arte falsa,
entrando qualquer coisa para ser exposta nos museus
A crítica explica que os objetos e valores estéticos que se apresentam como arte são aceites em completa submissão aos princípios de uma autoridade impositora. Isto faz com que, a cada dia, formem-se sociedades menos inteligentes aproximando-nos da barbárie.
O Ready Made
Lésper aborda também o tema do Ready Made, expressando perante esta corrente “artística” uma regressão ao mais elementar e irracional do pensamento humano, um retorno ao pensamento mágico que nega a realidade. A arte foi reduzida a uma crença fantasiosa e sua presença em umero significado. “Necesitamos de arte e não de crenças”.
Génio artístico
Da mesma maneira, a crítica afirma que a figura do “génio”, artista com obras insubstituíveis, já não tem possibilidade de manifestar-se na atualidade. “Hoje em dia, com a superpopulação de artistas, estes deixam de ser prescindíveis qualquer obra substitui-se por outra qualquer, uma vez que cada uma delas carece de singularidade“.
O status de artista
A substituição constante de artistas dá-se pela fraca qualidade de seus trabalhos, “tudo aquilo que o artista realiza está predestinado a ser arte, excremento, objetos e fotografias pessoais, imitações, mensagens de internet, brinquedos, etc. Atualmente, fazer arte é um exercício ególatra; as performances, os vídeos, as instalações estão feitas de maneira tão óbvia que subjuga a simplicidade criativa, além de serem peças que, em sua grande maioria, apelam ao mínimo esforço cuja acessibilidade criativa revela tratar-se de uma realidade que poderia ter sido alcançada por qualquer um“.
Neste sentido, Lésper afirma queao conceder o status de artista a qualquer um, todo o mérito é-lhe dissolvido e ocorre uma banalização. “Cada vez que alguém sem qualquer mérito e sem trabalho realmente excepcional expõe, a arte deprecia-se em sua presença e concepção. Quanto mais artistas existirem, piores são as obrasA quantidade não reflete a qualidade“.
 Que cada trabalho fale pelo artista
O artista do ready made  atinge a todas as dimensões, mas as atinge com pouco profissionalismo; sfaz vídeo, não alcança os padrões requeridos pelo cinema ou pela publicidade; sfaz obras eletrónicasmanda-as fazer, sem ser capaz de alcançar os padrões de um técnico mediano; senvolve-se com sons, não chega à experiência proporcionada por um DJ; assume que, por tratar-se de uma obra de arte contemporânea, não tem porquê alcançar um mínimo rigor de qualidade em sua realização.
Os artistas fazem coisas extraordinárias e demonstram em cada trabalho sua condição de criadoresNem Damien Hirst, nem Gabriel Orozco, nem Teresa Margolles, nem a imensa e crescente lista de artistas o são de fato. E isto não o digo eu, dizem suas obras por eles“.
 Para os Estudantes
Como conselho aos estudantes, Avelina diz que deixem que suas obras falem por eles, não um curador, um sistema ou um dogma.Sua obra dirá se são ou não artistas e, se produzem esta falsa arte, repito, não são artistas”.
O público ignorante
Lésper assegura que, nos dias que correm,
a arte deixou de ser inclusiva, pelo que voltou-se contra seus próprios
princípios dogmáticos e, caso não agrade ao espectador, acusa-o de “
ignorante, estúpido e diz-lhe com grande arrogância que, se não agrada é por que não a percebe“.
O espectador, para evitar ser chamado ignorante, não pode dizer aquilo que pensa, uma vez que, para esta arte, todo público que não submete-se a ela é imbecil, ignorante e nunca estará a altura da peça exposta ou do artista por trás dela.Desta maneira, o espectador deixa de presenciar obras que demonstrem inteligência”.
Finalizando
Finalmente, Lésper sinaliza que a arte contemporáneé endogámica, elitista; com vocação segregacionista, é realizada para sua própria estrutura burocrática, favorecendo apenas às instituições e seus patrocinadores. “A obsessão pedagógica, a necesidade de explicar cada obra, cada exposição gera a sobreprodução de textos que nada mais é do que uma encenação implícita de critérios, uma negação à experiência estética livre, uma sobreintelectualização da obra para sobrevalorizá-la e impedir que a sua percepção seja exercida com naturalidade“.
A criação é livre, no entanto a contemplação não é. “Estamos diante da ditadura do mais medíocre”


fonte: Vanguardia
 A Arte Contemporânea é uma farsa: Avelina Lésper | Incubadora de Artistas

sexta-feira, 24 de abril de 2015

Oferta em Artes Cênicas em São Gonçalo

São Gonçalo, 23 de Abril de 2015

Por Carol Magalhães




Curso com Contribuição Consciente desperta interesse do alunado pelo teatro

O Curso “Nativos Artes Cênicas” oferece mais de 120 vagas direcionadas para os alunos de ensino médio e fundamental das escolas públicas e privadas. A iniciativa é idealizada pelo Projeto Alternativo visando o desenvolvimento do alunado e a criação de uma Escola em Arte Cênicas para o município. Para o Gestor Cultural André Correia além de utilizar técnicas e sistemas inovadores durante as aulas, o formato da “Contribuição Consciente” tem atraído muitos interessados. “Um curso em Artes Cênicas de qualidade custa caro e muitos não podem pagar. O modelo de “Contribuição Consciente” tem conquistado adeptos no mundo inteiro e pode ser a única forma de muitos estarem cursando esta oportunidade de formação.” Defende o coordenador do cruso.
As aulas serão ministradas na Academia Twister no Centro de São Gonçalo. Serão (4) professores distribuídos em (6) grupos, nos turnos da manhã, tarde e noite. Artistas e dançarinos e profissionais do corpo terão oportunidades de ingressarem no curso “Contato Improvisação”, ministrado pelo professor Zé Anderson Hanzen. Além disso, os alunos terão a oportunidade de estudar teatro com os universitários Nicolle Longobardi , Fernando Porto e Silvio Júnior
Para mais informações basta preencher o guia de informações:

Mais Informações:
Telefone: 9-8544-8622
E-mail : nativosg@gmail.com


sexta-feira, 13 de março de 2015

Ferreira Gullar falando de arte


Ferreira Gullar, um dos mais importantes críticos de arte da atualidade, além de poeta, concedeu esta entrevista abaixo em 2007 ao Jornal de Brasília, que transcrevo, pela sua atualidade e importantes observações sobre o mundo das artes plásticas hoje.


É importante lembrar que Ferreira Gullar e Hélio Oiticica, artista plástico brasileiro, participaram juntos da criação do Neoconcretismo, no final dos anos 50. Em 1959, Gullar escreveu o Manifesto Neoconcreto, que influenciou decisivamente o desenvolvimento da obra de Oiticica. Em seguida, Gullar formulou sua Teoria do Não-objeto, a partir da observação do processo criativo de Lygia Clark. Depois, ele fez autocrítica dessas posições anteriores.

Jornal de Brasília - No que consiste e o que induziu a esta situação de mistificação no território das artes?

Ferreira Gullar - A questão é que as tendências mais radicais da arte contemporânea levaram a uma destruição das linguagens artísticas. Por falta de coragem, não se faz a crítica deste processo, no momento em que as propostas radicais da vanguarda chegaram a um ponto de exaustão, chegaram a um ponto onde não tem mais nada a ver com a arte.

J.B. - Como isto se torna possível?

Gullar - Por um lado existe uma crítica omissa, conivente e conveniente, por outro lado existem instituições que, de alguma maneira, dependem desta situação para sobreviver. Você tem o exemplo de uma exposição de renome internacional como a Bienal de Kassel, que teve como curador um sujeito que declarou que não sabia mais o que era a arte. Ele selecionou os nomes dos artistas. Claro que não é possível definir cientificamente o que é arte. Mas se uma pessoa não sabe o que é arte não tem condições de organizar uma Bienal.
J.B. - Qual o alcance da crítica que dirige a Marcel Duchamp? Até que ponto nega Duchamp? Ele não ampliou o repertório, os materiais e os limites da arte?

Gullar - É preciso colocar as coisas em seu devido lugar. Eu não nego a importância de Marcel Duchamp. Mas ele é apenas um dos que ampliaram o campo da arte para as novas formas como objeto. O caminho de ruptura com as formas tradicionais já havia sido aberto pelos dadaístas. E o próprio caminho que Duchamp
segue é uma conseqüência de papier collé cubista. A utilização da estopa, areia e prego nos quadros cubistas já prenuncia o abandono da tela e a incorporação do objeto como matéria da arte. Duchamp não nasceu do nada. A diferença está entre o que Duchamp fez no tempo dele e no que se quer fazer hoje.

J.B. - Em que sentido?

Gullar -  Quando Duchamp enviou um urinol a um salão estava realizando um gesto de alto inconformismo e denunciando uma série de imposições que envolviam a arte naquele momento. O urinol não é obra de arte. Quando ele fez isto o seu gesto era rebeldia, mas hoje seria puro conformismo. As instituições já assimilaram este gesto. Esta atitude de denúncia e de arte sem linguagem já se exauriu. Em Duchamp esta atitude era significativa de uma postura ética. Mas por outro lado contribui para a destruição da obra de arte. Duchamp sacrificou a sua obra em razão desta atitude ética. A obra de Duchamp é datada.

J.B. - Em entrevista, você afirmou que Lygia Clark e Hélio Oiticica eram excessivamente cerebrais. Mas a busca dos dois não era precisamente do sensorial?

Gullar -  O Hélio era um cara de um indiscutível talento e que levou ao ponto extremo as experiências do neo-concretismo do qual eu era o teórico. E digo mesmo que houve uma influência recíproca dos artistas plásticos sobre a minha poesia e da minha poesia sobre os artistas plásticos. O meu Poema Enterrado influenciou os trabalhos de Hélio. Então eu não estou falando de fora. Nós pegamos a linguagem concreta e altamente intelectualizada e colocamos uma nova substância nela. A Lygia tem uma trajetória de uma enorme coerência, desde o momento em que os quadros delas incorporaram a moldura como espaço de expressão até a série Bichos, inovadora e verdadeira.
Mas, ao invés de aprofundar o desenvolvimento desta linguagem, ela resolveu seguir adiante, destruindo a própria linguagem. Quando coloca sacos de papel na parede ou fios de nylon na boca, reduz a experiência estética a algo meramente sensorial. Acaba com a dimensão reflexiva e espiritual da obra de arte. E consequentemente o homem se torna um bicho.
E agora respondo a sua pergunta: o excesso de intelectualismo levou ao puro sensorial.

J.B. - Mas você faria esta mesma avaliação do trabalho de Hélio Oiticica?

Gullar - O último trabalho que vi do Hélio era uma instalação no Hotel Meridien. Era um espaço com água e pedrinhas. Você tinha de retirar o sapato para sentir a água e as pedra. Olha só aonde leva este cerebralismo: a idéia de recriar a natureza dentro de um hotel. Francamente, se é para sentir a natureza acho melhor ir para Mauá.
E, ao invés de colocar as implicações deste tipo de atitude, a crítica fica louvando. Quem criticar isto é careta ou reacionário. Outro dia eu tive uma discussão com uma amiga minha e ela citou Andy Warhol que dizia que uma atitude podia ser uma obra de arte. Mas quem é Andy Warhol? É o papa? É deus? Ele era um artista interessante que se rendeu ao comercialismo. Como teórico para mim era um babaca.

J.B. - Não haveria, por exemplo, sintonia entre os parangolés de Hélio Oiticica e os mantos de Arthur Bispo do Rosário?

Gullar -  Não tem nada a ver. Os parangolés surgiram a partir do momento em que Hélio Oiticica passou a freqüentar a escola de samba da Mangueira. É algo muito pobre se você comparar com a roupa de uma porta-bandeira, colorida, barroca, popular. É uma arte que remonta ao século 17. Aí o Hélio botava a roupa em um passista e pedia para o cara rodar e falava que isto ele estabelecia uma relação da forma com o espaço e a luz. É pura teoria. Qualquer objeto rodando mantém uma relação com o espaço e a luz.

J.B. - Mas a incorporação que o Bispo faz dos objetos não evoca a procedimentos da arte moderna?

Gullar -  O Bispo é exatamente o contrário da arte moderna. Em seu delírio, ele quer salvar os objetos do mundo. Ele começou a desfiar o próprio uniforme de interno para bordar um manto sagrado. A sua busca é busca do sagrado. Não tem nada a ver com a sofisticação vazia da arte moderna. Só um louco se entrega totalmente a esta missão de salvar os objetos do mundo. É uma loucura que imprime esta força interior aos objetos do Bispo.
A arte moderna é de decadência, de cerebralismo, de sofisticação exaurida. O que a arte precisa é de paixão e não de cerebralismo. No contexto pretensioso desta arte moderna todos se acham gênios.
O Leonardo da Vinci, quando pediram a ele uma escultura, realizou um estudo reunindo todos os escultores que admirava no passado. Hoje o sujeito enrola três tijolos com arame, manda para a Bienal e diz que é arte. Na Bienal de Veneza, eles aceitaram um açougueiro que tinha cortado uns pedaços de tubarão. Agora não é mais necessário aprendizagem artística. Nas bienais nós temos açougueiros, marceneiros, eletricistas, cineastas. Li que Almodóvar expôs na Bienal de Veneza. Eu queria perguntar a ele se para ser cineasta não é preciso aprender a linguagem do cinema.

J.B. - E, agora, que perspectivas vê para a arte diante do mundo?

Gullar -  Acho que o que a arte tem de fazer é parar de falar sobre ela mesma e começar a falar do mundo. Nós temos 40 mil anos de arte falando do mundo e dos problemas do  homem no mundo. A arte de voltar a falar da vida. 
 
 
 

quarta-feira, 11 de março de 2015

O uso da gravura de temática religiosa na formação do artista na Academia Imperial das Belas Artes *


Reginaldo da Rocha Leite

Este texto tem por objetivo central abordar a relevância da gravura artística de temática religiosa no ensino acadêmico brasileiro, tendo a Academia Imperial das Belas Artes como estudo de caso. É notório o papel fundamental dos livros de gravuras europeias utilizados durante o período colonial, alicerçando a realização de trabalhos pictóricos em tetos de igrejas brasileiras. No entanto, a contribuição da gravura não se restringe ao Brasil-colônia sendo, também, material didático nas aulas ministradas na Academia Imperial.
Durante o Oitocentos, no Brasil, a ausência de Museus implicou na busca por uma alternativa palpável para a consulta dos alunos a obras de grandes mestres europeus.  Adquirir pinturas originais ou cópias de telas estrangeiras nem sempre era possível; portanto, a saída para o impasse foi recorrer à gravura de reprodução.
Várias coleções de gravuras foram compradas pela Academia Imperial das Belas Artes respeitando determinados critérios. Essas coleções deveriam ser oriundas das Escolas Francesa, Holandesa, Alemã, Italiana ou Espanhola. Na seara da temática, as pranchas apresentavam especificidades: abordavam o desenho anatômico (muito importante durante a formação do artista oitocentista), os retratos (relevante fonte de renda para os alunos), as cenas mitológicas e, finalmente, os assuntos extraídos da Bíblia, da Legenda Áurea[1] e dos Evangelhos Apócrifos.[2]
A formação artística na Academia se dava não por um período de tempo específico para cada curso, mas sim de acordo com a absorção, por parte dos alunos, do conteúdo programático. O aprendizado estava pautado em regras rígidas e numa metodologia referencial. Primeiramente, o aluno deveria copiar os desenhos confeccionados pelos professores da Academia Imperial e as gravuras européias.  Concluindo essa fase, o estudante passaria a desenhar cópias das moldagens em gesso para, posteriormente, aprofundar a observação e o estudo do modelo vivo.  A última fase se dava com a prática da cópia de pinturas européias para finalmente produzir-se uma obra original. A gravura artística era, então, um dos alicerces da formação do artista oitocentista, servindo de base didática para todos os cursos da Academia.
As Coleções de Gravura da Academia Imperial das Belas Artes
A Academia Imperial era provida de coleções de gravuras com temáticas variadas, Escolas distintas, mas com funções convergentes. Existe uma quantidade significativa de documentos no Museu D. João VI/EBA/UFRJ indicando a aquisição e origem dessas gravuras de cunho didático.
Em relação aos assuntos, as gravuras ofereciam um leque bastante amplo de opções para estudo: partes do corpo humano (pés, orelhas, bocas, narizes, olhos, mãos e partes do rosto); corpos nus em diversas posições visando o aprendizado das proporções clássicas; cópias de esculturas greco-romanas; retratos de nobres e religiosos europeus; temas oriundos da literatura religiosa e mitológica; e finalmente, romances orientalistas. Cada Escola Européia tinha a sua linguagem distinta. As Escolas Holandesa, Alemã e Espanhola primavam pela retratística. As Escolas Francesa e Italiana, além do retrato, também valorizavam as gravuras produzidas a partir de pinturas e esculturas de artistas renomados. Pela dimensão física do comunicado, nos deteremos, somente, à relação da gravura de temática religiosa com a metodologia de ensino acadêmico tendo como suporte as gravuras da Escola Francesa.
A Gravura de Temática Religiosa
Não queremos afirmar que a temática religiosa seja superior aos outros assuntos abordados pela gravura, no entanto trabalhamos com a hipótese de que esse tema específico correspondia a todas as exigências pedagógicas de uma instituição de ensino artístico, fosse européia ou brasileira.
Durante a primeira metade do século XIX, os temas referentes à mitologia greco-romana ou à propaganda política do monarca detinham todas as atenções no âmbito da Academia Imperial das Belas Artes.  No entanto, com o advento da poética romântica e sua aceitação pelos membros da instituição, na segunda metade do Oitocentos, os temas trágicos, orientalistas, grandiloquentes e religiosos alcançam um elevado patamar. As gravuras, base para o estudo do desenho e do tema, que abordam assuntos românticos transformam-se em “meninas dos olhos” dos professores e alunos da instituição.
A literatura era vista como grande aliada na busca por assuntos que visavam o pathos fisionômico das personagens, a riqueza ornamental da indumentária, a dinâmica movimentação das figuras e o terror por parte dos suplícios dos santos mártires. Os textos literários convergiam diretamente com a produção artística oitocentista. Nesse período, a Europa estava mergulhada nos ideais românticos e as gravuras, então adquiridas pela Academia carioca, inseriam-se nesse perfil.
Delimitando-nos na temática religiosa, os assuntos poderiam emergir do Novo ou Antigo Testamentos, dos Evangelhos abolidos pela Igreja Católica, ou mesmo tendo como fonte inspiradora a vida dos santos buscadas na Legenda Áurea.
Alguns pintores eram escolhidos como modelo para terem suas obras reproduzidas em gravuras didáticas. A escolha não era feita aleatoriamente, a Academia Imperial privilegiava determinados nomes, como o de Girodet-Triosson que dentre todos os pintores copiados, em gravuras, era o mais significativo quantitativamente. A cena mais explorada pelos gravadores é a da obra O Dilúvio de Triosson [Figura 1]: várias gravuras dão conta da cena desesperada em que as personagens estão inseridas. Grande parte das gravuras constitui detalhes da obra pintada valorizando expressões faciais, movimentações dos corpos, evidenciações da musculatura e a inserção do teatro trágico como atmosfera.
O ensino na Academia Imperial era direcionado para a assimilação dos ideais clássicos de composição, mas com a difusão das gravuras com assuntos da história européia e sacra, a metodologia começa a sofrer uma adaptação que influenciará toda a segunda metade do século XIX. Anjos fúnebres, celestiais, cenas trágicas e martírios passam a povoar o imaginário criador dos alunos alicerçando uma enfática produção simbolista e de cunho romântico.
Pela cópia da gravura religiosa, o aluno além de ser inserido ao tema, também tem contato com a história sacra, a anatomia dos corpos, a fisiologia das paixões e com a indumentária antiga. Como já dissemos, apesar do ensino da gravura ter sido irregular durante o século XIX, o uso da gravura como ferramenta pedagógica atrelada à literatura foi extremamente relevante na formação do artista oitocentista alicerçando configurações formais e tipológicas. 


LEITE, Reginaldo da Rocha. O Uso da Gravura de Temática Religiosa na Formação do Artista na Academia Imperial das Belas Artes. 19&20, Rio de Janeiro, v. I, n. 2, ago. 2006. Disponível em: http://www.dezenovevinte.net/ensino_artistico/reginaldo_gravura.htm

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* Texto da comunicação apresentada no XII Encontro de Programa de Pós-Graduação em Artes Visuais da EBA/UFRJ. 
[1] A Legenda Áurea é uma compilação das vidas de santos composta no século XIII pelo dominicano e hagiógrafo italiano Jacobus (Tiago) de Voragine (c. 1230-1298).
[2] Apócrifo é o documento escrito, que apesar de apresentar-se como inspirado, não faz parte do cânon bíblico judaico ou cristão.

terça-feira, 24 de fevereiro de 2015

“Eu nunca mais vou assinar uma carteira de trabalho na vida”


O chef Erick Jacquin fala sobre a dificuldade de manter um restaurante no Brasil, sua fama de durão e seu jeito de encarar as críticas

Erick Jacquin  (Foto: Época NEGÓCIOS / Alexandre Severo)
Erick Jacquin é um chef exigente ao extremo. Um dos mais premiados do Brasil, ele é uma das estrelas da versão brasileira do reality show MasterChef, programa de televisão produzido em mais de 40 países. Ao lado de outros dois cozinheiros renomados, Henrique Fogaça e Paola Carosella, Jacquin avalia chefs amadores e dispara frases nada amigáveis – “parece que você fez comida para as galinhas” ou “esse bife parece um bicho que vai andar”.
 
 
As frases divertidas - e sinceras demais – agora lhe rendem audiência, mas no passado lhe renderam processos trabalhistas. Estima-se que o cozinheiro tenha dívidas de R$ 1,5 milhão, entre falta de pagamentos a fornecedores e ações de ex-funcionários na Justiça. Seu restaurante, o La Brasserie, de alta gastronomia, fechou as portas no final do ano passado.
A fama de durão e de difícil convivência veio depois de empregados revelarem xingamentos e até arremessos de pratos pelo francês. À Época NEGÓCIOS, Jacquin afirmou estar mais calmo hoje em dia e que o seu jeito explosivo seria, na verdade, uma cobrança interna. “A exigência que eu tenho com os outros, eu tenho comigo. Ela está dentro de mim. Não é falta de respeito. Tem muita gente que me agradece”.

Agora, Jacquin tem a oportunidade de se tornar conhecido fora da cozinha - a sua exigência por qualidade já ganhou fãs pelo Brasil. “Eu gosto de botar pressão e gosto de trabalhar sob pressão. Um pouquinho de medo não faz mal”, afirma. Mas ele se recusa a contratar alguém novamente.

Você nasceu em uma cidade pequena do Vale do Loire, na França, e chegou ao Brasil em 1995. Porque decidiu vir para cá?
Quando eu cheguei ao Brasil, eu já era chef em Paris. Eu fui convidado a trabalhar aqui por um senhor chamado Vincenzo Ondei, que na época tinha um restaurante chamado Le Coq Hardy [restaurante no Itaim que fechou em 2008]. Fui convidado para ser o chef do lugar. Eu pensei muito nesse convite. Em outubro de 1994, vim conhecer o país. Fiquei por aqui uma semana. Voltei para a França, conversei com a minha esposa na época [a sommelière Katia Lefriec] e ela concordou. Nós mudamos em fevereiro de 1995. Imaginávamos passar três ou quatro anos, ganhar um dinheiro, voltar para a França e comprar um restaurante. No fim, estou aqui ainda.

Como você se apaixonou pela gastronomia?
Eu nunca quis fazer outra coisa. Desde moleque, eu sempre dizia que queria ser cozinheiro. Eu nunca imaginei fazer outra coisa, infelizmente.

Por que infelizmente?
Porque ser cozinheiro não é ter uma vida normal – é muito mais do que uma profissão, principalmente quando se quer fazer muito bem. Eu decidi o que eu queria fazer muito novo e comecei a trabalhar muito novo. Meus pais se preocupavam muito comigo, porque essa é uma profissão em que se trabalha enquanto as outras pessoas estão se divertindo. Não é fácil começar jovem, mas nunca foi um problema para mim, porque eu sempre me diverti trabalhando. Na realidade, eu nunca trabalhei. Eu trabalhei muito, mas nunca foi um trabalho, ainda não é um trabalho, é tudo – é a minha vida. Então, eu não me arrependo. Eu não sei se existe no mundo uma profissão que me deixaria mais feliz do que cozinheiro.

Você disse que trabalha muito. Quantas horas por dia?
Um cozinheiro que trabalhou 12 horas no dia teve um bom dia de trabalho. Agora, não é bom trabalhar muito. O chef que trabalha 18 horas, já não cozinha igual, já não consegue fazer coisa boa. No Brasil, por exemplo, o restaurante fecha muito tarde. Às vezes, até 1h da manhã. Na Europa, nenhum restaurante muito bom vai te receber nesse horário. Um bom restaurante na França fecha às 21h30, 22h no máximo. Você acha que o cozinheiro de um restaurante que abriu cedo tem vontade de fazer um prato à meia-noite? Impossível.

Quando você decidiu ser chef?
Eu nunca decidi ser chef, eu decidi ser cozinheiro, o que é muito diferente. Antes de ser chef, precisa querer ser cozinheiro. Mas aqui no Brasil todo mundo quer ser chef e não quer ser cozinheiro. A ordem é: primeiro vamos aprender a cozinhar, depois vamos ser chef e depois vamos aparecer na televisão. Tem muita gente que quer fazer televisão, antes de ser cozinheiro. E é por isso que aqui existem chefs que são péssimos cozinheiros. É lógico que eu não vou citar nomes. Mas tem, e muito. Essa profissão foi muito valorizada por aqui, assim como publicidade e advocacia. Eu não consigo entender como uma faculdade no Brasil vende curso de chef de cozinha. Existe curso de presidente da República? Existe curso de presidente de banco? Não, tem curso de economia. A escola é importante, mas um bom chef aprende na prática.

Como você começou na profissão?
Depois de escolher ser cozinheiro, meu pai pediu que eu fosse até a confeitaria da cidade onde eu nasci, um lugar de quatro mil habitantes, para trabalhar durante o Natal. Eu trabalhei durante o Natal e o Ano Novo e adorei. Tinha 15 anos. Depois, conheci um cara que tinha um buffet e fazia festa. Trabalhei lá no verão e adorei também. Eu dizia: é isso que eu quero fazer. Minha mãe queria que eu estudasse. E eu estudei, mas não queria. Eu queria mesmo era trabalhar. Depois, minha mãe me colocou em uma escola de gastronomia com duração de dois anos – mas em uma verdadeira escola, com 30 alunos. Lá tinha um restaurante aberto ao público. Nós cozinhávamos todos os dias, não era uma escola para faturar com dois mil alunos. Depois fui para Paris, onde eu realmente comecei minha carreira de cozinheiro até virar chef de cozinha em 1989, aos 25 anos.

Naquela época, quem te inspirava? Tinha algum grande chef conhecido?
Isso não existe. É bobagem. Eu nunca comprei um livro de cozinha, por exemplo. A minha inspiração vem do cheiro. O cheiro da comida. O cheiro do produto. A maioria das fotos dos pratos que estão nos livros, nos jornais ou nas revistas não dá pra comer. A imagem da foto do livro tem pouco a ver com o prato que é servido nos restaurantes. Tem comida para o livro, para a revista, para o jornalista e tem comida para o cliente. O mais importante da comida é o cheiro. Eu não me espelhei em ninguém, meu foco era só no cliente.

Hoje, você é um dos chefs franceses mais famosos do Brasil. Como você acredita ter chegado até aqui? Foi a sua obsessão por qualidade?
Perseverança e coragem – eu nunca desisti diante das dificuldades. Até porque, às vezes, a felicidade atrapalha mais que a dificuldade. Você acha que já chegou lá, que virou o chef do ano, que é o melhor da França no país. E, na verdade, é o contrário. É nesse momento que você tem que fazer muito mais. Porque não é fácil, muita gente tem inveja, muita gente quer pegar o seu lugar. Em dois momentos da sua vida você deve lutar: lutar para continuar em uma posição boa e lutar quando você não estiver tão bem. Todo mundo tem uma fase ruim, não é?

No MasterChef tem pressão o tempo todo. Pressão no trabalho atrapalha ou ajuda?
Depende do que você faz, depende do que você quer. O elogio atrapalha. Em alguns casos, se você disser para o cara que a comida dele está excepcional, ele vai relaxar. Eu não sou uma pessoa que faz muito elogios. Nunca fiz muitos elogios para as pessoas que trabalhavam comigo. Se eu fizesse um elogio, as pessoas até ficavam espantadas. Eu acredito que o elogio atrapalha. Eu também não sou uma pessoa que gosta de ficar recebendo elogios. Para ajudar alguém, você deve elogiar na hora certa. Se a pessoa estiver deprimida, você deve elogiar para ela voltar. Mas se as pessoas estão bem, você não pode elogiar – você vai diminuir o padrão do trabalho. No MasterChef, eu dei uma dura em vários candidatos para que eles ficassem. A pressão é importante. Eu gosto de botar pressão e gosto de trabalhar sob pressão. Um pouquinho de medo não faz mal.

O que é preciso fazer para ser um bom cozinheiro no Brasil?
Trabalhar. Não existe bom chef no Brasil, um bom chef na França ou um bom chef na Itália. Precisa trabalhar muito, aprender, mudar várias vezes de restaurante. Para chegar lá, você também não pode estar com pressa de ganhar dinheiro. Eu trabalhei muitos anos ganhando pouco. Demorei a comprar o meu primeiro carro, por exemplo. Ia trabalhar de trem em Paris. O meu quarto tinha 11 metros quadrados. O chuveiro era no corredor. Dizem que francês não toma banho, mas nós tomávamos muito, porque tínhamos o cheiro da comida [risos].  Se eu pudesse dar uma dica para ser um bom cozinheiro seria: faça uma faculdade de manhã de administração e trabalhe em um restaurante durante a noite – muito melhor do que entrar em uma faculdade que tem professores de 24 anos, que são ex-alunos da escola. É besteira. Se eu pudesse dar uma dica para ser um bom chef, seria: ouça os seus clientes. Muitas pessoas não gostam de ouvir os outros, mas os chefs têm obrigação de ouvir os clientes. Os clientes são as estrelas do restaurante. Não são os jornalistas que dão as estrelas, são os clientes. Eu pergunto aos meus clientes sobre a comida. Às vezes, eu não concordo, mas eu pergunto.

O bom chef deve se dedicar só a cozinha, sem se preocupar com a administração?
Eu não sou a melhor pessoa para responder a essa pergunta [risos]. Existem chefs que são bons administradores e outros que são péssimos. Acho que a administração toma muito tempo de um restaurante e o chef fica sem tempo de cozinhar. Ele não deve administrar o local, mas deve no mínimo se interessar pelas contas – ele precisa saber quanto pode gastar, por exemplo, mas não deve pensar só em números.

Quem é o melhor chef do Brasil para você?
Eu nunca vou falar isso. Nem sei. Não acredito nisso. Não tem um chef melhor que o outro, cada um tem a sua especialidade e experiência.

Em novembro do ano passado, o seu restaurante francês La Brasserie fechou as portas por problemas de administração após nove anos. Onde você errou? O que faria diferente se pudesse?
Quando eu abri esse restaurante, há dez anos, errei de local. Errei de bairro. Não tenho nada contra Higienópolis, mas a cidade mudou - e é um inferno agora. Os meus clientes do Morumbi não iam mais lá, por exemplo. Os clientes falavam: “Jacquin, me desculpe, mas o seu restaurante é contramão, é muito longe”.  Outro erro foi que eu tive muitos funcionários. Se um dia eu abrir outro lugar, vai ser um local bem pequeno. Só para mim, sem sócio. Além disso, iria fechá-lo aos finais de semana e só ia deixar aberto até 22h30. É muito difícil de administrar e eu não estou falando só da parte financeira. Fechar o restaurante foi uma decisão certa, porque hoje as pessoas lembram dele de uma forma positiva – elas lembram do bom serviço e da boa comida que nós servíamos. E eu não queimei o meu nome.

Então você pensa em abrir outro restaurante?
Não, eu nunca mais vou assinar uma carteira de trabalho na vida. Até que o Brasil passe por reformas, nunca mais vou assinar uma carteira de trabalho. Vai chegar uma época em que ninguém mais vai querer ter funcionário, só as grandes empresas. A injustiça é o que mais me incomoda. Eu não sou milionário, sou cozinheiro e trabalhador. Eu não fui o chef que não trabalhava. Precisa ser muito corajoso para pedir um alvará de restaurante no Brasil. É documento atrás de documento. Pode ser que o governo esteja certo, mas eles precisam facilitar o processo.

Todo mundo conhece o seu jeito explosivo. Esse jeito, que antes te atrapalhava na La Brasserie, hoje te favorece no MasterChef?
Pode ser. O MasterChef me deu a oportunidade de mostrar quem eu sou. Eu não mudei. O meu personagem sou eu. Mas era bem mais duro no meu restaurante do que no MasterChef. Aliás, nem sou tão duro no MasterChef.

Você ganha dinheiro participando do programa? 
Não. Tem uma ajuda de custo. Com o programa, eu espero ganhar dinheiro no futuro. O MasterChef é a oportunidade de ser conhecido por um público diferente. Hoje, eu sou conhecido pelas classes A e B – e o programa irá me fazer muito mais conhecido.

Você tem sido abordado nas ruas pelas pessoas?
Às vezes, sim. As pessoas me chamam de bravo [risos] e eu recebo muitos elogios também.

Estima-se que você e a La Brasserie possuam dívidas e ações trabalhistas de R$ 1,5 milhão. É verdade? Como você pretende pagar essas dívidas?
Como você acha que se paga uma dívida? Em dinheiro [risos]. Se alguém aceitar uma permuta, precisar fritar um ovo, eu vou. Já paguei alguns fornecedores trabalhando. Mas tem dívida que vai ser difícil pagar. Eu sei que não vai ser fácil. Hoje, eu vivo de fazer jantares nas casas das pessoas. Não é todo dia que tem, mas tem. Com o MasterChef, eu vou ter mais oportunidade. O meu restaurante era caro, cerca de R$ 300 por pessoa. O cara que ia lá nem sempre tinha muito dinheiro. Alguns iam só quando era aniversário de casamento, por exemplo. Eu vendia uma mesa dentro da cozinha por R$ 1,3 mil para duas pessoas. A qualidade tinha que ser impecável. Perguntava para as pessoas que trabalhavam comigo: ‘Imagina que esse prato vai custar R$ 120, você pagaria? Não? Então porque você quer que os outros paguem? Porque os clientes devem pagar pela merda que você faz?’ Agora, sobre o valor das dívidas: eu não fiz a conta. É sério, mas deve ser por aí.

Hoje você está mais tranquilo ou continua arremessando pratos nas pessoas? Essa história é real?
Hoje, eu sou muito mais tranquilo. Estou mais velho e, depois que fechei a La Brasserie, tenho muito menos pressão. Não foi fácil fechar esse restaurante. Muita gente só olha o meu lado durão, só fala que o estabelecimento fechou. Eu chorei muito. Os bancos não queriam mais conversar comigo. Tentei muito, lutei muito. Muitos funcionários me ajudavam e gostavam de mim. O problema é que as pessoas só gostam de valorizar o que não deu certo. Teve funcionário que falou mal de mim, mas que trabalhou só três meses comigo. Esse não sabe quem eu sou. Eles falam mal, mas quando vão procurar emprego dizem que já trabalharam com o Jacquin. Pode me odiar, pode falar tudo que eu sou, pode ser que seja verdade, mas todo mundo fala que trabalhou comigo. Eu nunca prejudiquei um ex-funcionário. Nunca disse para não contratar alguém quando me pediam referência. Eu quero ver as pessoas felizes para que elas parem de falar mal de mim.

Você lida bem com criticas?
O que você acha? Se os clientes forem justos e honestos, eu não tenho nada contra. A crítica é muito boa. Eu gosto de polêmica, eu sou polêmico. Mas a crítica me incomoda quando ela é ignorante. A ignorância me incomoda. Eu sofri muito com uma matéria mal escrita divulgada em uma revista há dez anos. As pessoas pediam para eu não me importar, mas a matéria falava mal de tudo, não tinha nada de positivo. A crítica, até no MasterChef, sempre tem um lado positivo, não existe só o lado negativo. Tudo na vida tem um lado positivo. Todas as pessoas que trabalham no mundo merecem um lado positivo.

Em que momento o talento atrapalha?
O talento atrapalha quando os outros ficam com inveja do seu trabalho. O talento mesmo nunca atrapalha - o que atrapalha são as pessoas que querem te atrapalhar. A vida é um reality show. Hoje, eu tenho certeza que a vida é um jogo. Acredito que talento não é nada sem trabalho duro e perseverança. Músico é assim: tem gente que tem talento para tocar piano, por exemplo, mas se não se esforça, vai tocar de uma forma média. Tem gente que não tem talento, mas trabalha todo dia, toda hora – esse vai conseguir tocar piano muito bem.

Você disse que o que atrapalha é a inveja. Você sofreu muito com isso na sua carreira?
Não. Eu tinha muitos amigos. O que me faz sofrer é que as pessoas só valorizam as coisas negativas que aconteceram comigo. Tem ex-funcionário que fala mal de mim e nunca me defende, mas eu acho que nós temos que respeitar as pessoas que nos ensinaram a trabalhar. O chef francês que me ensinou a ser um bom cozinheiro, era pior do que eu, mas eu nunca vou falar mal dele. Ninguém queria trabalhar com ele. No começo, eu o achava maluco. Mas eu me dei bem com ele, trabalhamos juntos por seis anos. Eu aprendi muito, muito.


fonte: http://epocanegocios.globo.com/Informacao/Visao/noticia/2014/10/eu-nunca-mais-vou-assinar-uma-carteira-de-trabalho-na-vida.html