Todas as tendências visuais multiculturais do nosso tempo, todas as
questões estéticas da pop arte e todo o rescaldo pós-moderno vindo do
surrealismo e do dada mesclam-se e amalgamam-se no design de Rico Lins.
Seria melhor dizer nas imagens desse artista gráfico, já que Rico é
muito mais um homem de imagens do que de design, como revela em
entrevistas:
“Na Bauhaus, o design dialogava com a arte, moda,
dança, fotografia, arquitetura, poesia – dialogava com a sociedade.”
Esse diálogo é constante na obra do designer que cruza idéias, num
processo criativo que gira em torno no binômio da liberdade e do limite.
No mundo contemporâneo, o design se articula entre tecnologia, mercado e
cultura e, é assim, que Rico empreende seus projetos gráficos. Como
quando foi contratado para realizar o cartaz do filme Bananas is my
bussiness, um documentário ficcional sobre Carmem Miranda, o grande mito
pop brasileiro. O designer utilizou a imagem da boca de uma foto de
Carmem Miranda e a imagem de bananas de uma capa de disco feita por Andy
Warhol, para a banda Velvet Underground, no lugar dos olhos. Com o todo
o resto da foto rebaixado em 5%, visível, mas quase ausente, o conceito
do cartaz estava perfeito, a saber, um foco, uma visão da vida de
Carmem Miranda.
Ou quando foi procurado pela revista Kultur
Revolution para projetar suas capas. Rico trabalha com a revista há 27
anos. No início eram apenas capas diferentes para uma revista de
esquerda. Mas tornar-se-iam cult com o passar do tempo. O artista
gráfico experimenta bastante nessas capas e o público da revista está
preparado para essas viagens; logo, a parceria foi um sucesso. Numa capa
enfocando artigo sobre inteligência artificial, onde a inteligência
parece ir da cabeça para os dedos da mão, vemos uma mão estilizada em
cinza com vários vetores geométricos em torno dela e com o destaque para
a ponta dos dedos, num fundo rosa. Numa outra capa vemos abordagem de
um artigo contra o Fast Knowledge, a cultura rápida e descartável.
Nelas vemos a imagem de um cérebro marrom com vários talheres brancos
(garfos, facas e colheres) enfiados no cérebro sobre um fundo negro. E
na pega dos talheres em branco, as informações sobre a revista, como
título, reportagem, número e data. Rico tem uma relação muito boa com
os produtores da revista, assinando capas como ilustrador, como designer
ou como diretor de arte nas diversas versões da revista para os
mercados asiático, europeu e latino-americano, por exemplo.
O
designer não é carreirista e não gosta de galgar postos cada vez maiores
como prova de sua excelência, por que, embora seu trabalho seja
realmente excelente, para o pensador visual, a perfeição é péssima e o
design inclusivo e a liberdade criativa fazem parte do seu cardápio
profissional. Criação e especialização nem sempre se sentam à mesma
mesa e é por isso que Rico Lins estabeleceu-se no mercado com uma gama
hiper-variada de criatividade em projetos de design os mais diversos.
Segundo suas palavras, a cerca de uma lei da física, “o atrito gera
energia”. E é por essa máxima que o artista permeia toda a sua
produção, dialogando com arte, teatro, música, televisão, cinema, todo o
arsenal cultural, enfim, mergulhando e nadando com muito sucesso, nas
imagens como um verdadeiro designer de fronteira.
Eu, muito tempo atrás, perdi o gosto pela Coca-Cola.
Talvez a causa se encontre em suas bolhas efervescentes — há simplesmente muitas delas. Ou talvez o motivo seja, em sua versão americana, a doçura pegajosa do xarope de milho (subsídios para o milho e tarifas sobre o açúcar estão por trás disso). Ou talvez a razão seja o fato de que, depois de tomar uma dose, eu sinto um zumbido louco seguido por uma explosão devastadora. Eu jamais consegui entender como é que alguém ainda permanece acordado depois de um hambúrguer gigante, uma poderosa porção de batatas fritas e uma coca enorme.
Parece que não estou sozinho aqui. A Coca-Cola anda sofrendo com vendas em declínio na América do Norte e até mesmo no globo inteiro. O preço das suas ações foi atingido. Os gostos dos consumidores parecem estar mudando, migrando das bebidas fortemente açucaradas e saturadas de ácido carbônico para a água engarrafada, as bebidas desportivas e os energéticos. No drive thru do fast food da minha localidade, eu percebi que eles estavam promovendo as suas próprias bebidas geladas especiais em detrimento das bebidas gasosas convencionais.
Por que isso importa? Agora, batucando em meus ouvidos, ecoam os muitos anos de comentários histéricos de intelectuais que criticavam o suposto poder que a Coca-Cola exerce sobre o planeta inteiro. Eles se queixam de que os símbolos da Coca-Cola praticamente adornam o mundo todo; eles dizem que essa bebida engana as massas faz mais de um século; eles argumentam que essa bebida é o sinal mais visível da corrupção do capitalismo.
Mas espere! Certamente, as pessoas podem decidir beber ou não beber. Não, não, diz a elite intelectual que constantemente nos avisa do "mito da escolha" no mercado. Nós somos governados por forças estranhas que se encontram fora do nosso controle. Nós temos o receio de que, se não fizermos isso, se não bebermos a coca, não faremos parte da tendência predominante, não nos
adequaremos às expectativas impostas corporativamente em relação à maneira como deve ser o nosso comportamento. Em vez disso — em vez de poder escolher —, nós somos os peões de um jogo no qual essa assustadora empresa exerce o supremo papel de rei.
Bem, pense novamente. O que acontece é que o verdadeiro poder está nas mãos dos consumidores. Pare de consumir algo, e essa coisa desaparece. É assim que o mercado funciona. Nem mesmo um legado de 127 anos e uma tradição cultural aparentemente invencível são capazes de obliterar a decisão básica de comprar ou não comprar.
Outro sinal do declínio da Coca-Cola é o fato de que ela recentemente caiu do primeiro lugar para o terceiro lugar no ranking das marcas globais mais respeitadas. O novo número um é a Apple, e o número dois é o Google. Com efeito, dentre as 100 marcas que se encontram no topo, todas aquelas que apresentam movimentos mais rápidos são empresas de tecnologia. Trata-se de uma prova de como a comunicação está mudando o mundo. Mais comunicação significa mais concorrência — bem como a derrocada de hábitos arraigados.
Eu posso não morrer de amores pela bebida, mas nunca entendi o ódio que ela causou e continua causando. A Coca-Cola ostenta uma imensa contribuição à história cultural com a sua maravilhosa publicidade que se estende por todo o século XX. Você pode definir as décadas pelo brilhantismo dessa publicidade — os desenhos das antigas lojas de bebidas gasosas (soda-jerk); as campanhas de "ensinar o mundo a cantar"; o urso polar; ou as atuais fantásticas homenagens ao comércio além-fronteiras que reforça a paz e combate o desejo pela guerra.
Eu ainda me lembro de, alguns anos atrás, estar sentado na arquibancada em um jogo de baseball
e de me maravilhar com a absoluta imensidão do símbolo da Coca-Cola que estava pairando sobre o estádio. Por que essa empresa teve de gastar tanto com publicidade? Com certeza, nenhuma pessoa que estava sentada no estádio desconhecia a coca. Então, qual é o porquê dessa mania de promover a marca?
A publicidade, por si só, demonstra que a Coca-Cola, na verdade, não tem um "poder" sequer semelhante àquele que a polícia possui. Ela não tem a capacidade de obrigar as pessoas a beberem o seu produto. Essa publicidade, efetivamente, não significou desperdício de dinheiro. Ela estava promovendo a marca na esperança de mantê-la constantemente em nossas mentes, bem como fazendo propaganda do próprio apoio da empresa ao grande esporte que é o baseball. Existem mensagens subliminares em todos os anúncios publicitários? A Coca-Cola, com certeza, espera que sim.
E não há nada de errado nisso. Mas o que acontece quando os gostos mudam radicalmente? Isso é um problema grave. Os especialistas estão dizendo que os consumidores repentinamente passaram a preferir bebidas amargas com menos bolhas efervescentes. A Coca-Cola pode modificar a sua
receita ou introduzir, digamos, a bebida Coca-Cola Energy? Bem, ela é uma sobrevivente, então tudo é possível. Basta dar uma olhada em todas as marcas que ela adquiriu recentemente apenas para cobrir as suas apostas.
Você sabe o que é ainda mais espetacular do que o declínio da Coca-Cola? Olhe para a água engarrafada que a está substituindo. Agora, se os opositores da economia de mercado desejam criticar alguma coisa, trata-se de um caso perfeito. Muito do material da água engarrafada é mais caro do que a gasolina, que tem de ser extraída da terra e ser refinada em um processo incrivelmente complexo, baseado em intenso uso de bens de capital.
Na maioria das vezes, eu não consigo diferenciar umagarrafa de outra. Por falar nisso, eu nunca realmente entendi o que há deerrado com a água da torneira. Mas de gustibus non est disputandum ("gosto não se discute") e tudo o mais.
Se você fosse um planejador central, com a finalidade de definir preços independentemente da experiência de mercado, você estabeleceria o preço da gasolina ou da água engarrafada em patamares elevados? Trata-se de uma escolha muito óbvia, tendo como base tão-somente considerações
tecnológicas. Entretanto, os mercados existentes realmente nos demonstraram um resultado diferente de qualquer ideia que um intelectual de fora poderia alguma vez conceber.
De todas as coisas bonitas da economia de mercado, a sua característica mais admirável é a sua capacidade de confundir os intelectuais com surpresas implacáveis e resultados inesperados. Em sua pura imprevisibilidade, o mercado funciona no universo como uma força que nos torna humildes e como um lembrete de que, neste mundo, o verdadeiro e principal poder sempre residirá nas forças organizadoras descentralizadas da própria sociedade.
As pessoas poderosas podem retardar o progresso do mundo, mas elas não podem impedi-lo de mudar. Graças ao mercado, nós sempre estaremos redescobrindo a grande verdade de que o curso dos acontecimentos mundiais não é algo que alguém — nem mesmo uma empresa gigante como a Coca-Cola — possa definitivamente controlar.
No
dia 6 de maio de 2014 foi lançada a nova marca dos Correios. Uma das
maiores empresas brasileiras resolveu investir milhões de reais para
“modernizar” sua identidade visual. Parte do processo consistiu em uma
licitação através da qual contrataram a CDA Branding & Design for
People, que foi responsável pelo posicionamento estratégico e redesenho
da marca, por R$390.000,00. Como qualquer redesign, o projeto recebeu
elogios e críticas nos dias que se seguiram e a discussão continua.
Um
dos temas recorrentes em comentários é o plágio. Teve até reportagem
fazendo alarde sobre uma possível cópia. Surgiram vários links e imagens
de marcas que são “similares”. Plágio? Claro que não! A questão é que a
atual marca dos Correios é tão genérica, que se parece com várias
outras, incluindo até mesmo template do Shutterstock. Uma seta para cada lado, com efeito tridimensional, um tipo sem serifa geométrico e pronto!
A verdade é que a nova marca está sendo questionada em vários níveis, como por exemplo “a quem essa mudança serve?” e perguntas como esta que são absolutamente fundamentais, mas apesar de gastarem muito o verbo em textos e vídeos para justificar o que foi feito, não temos muitas respostas convincentes.
Segundo Jessé Gusmão de Abreu, designer gráfico dos Correios: “Tínhamos
uma noção que o redesign da marca tinha como princípio a evolução da
identidade atual, preservando os elementos de maior identificação da
marca e acrescentando o conceito de modernidade, mas sabíamos o que
teríamos de buscar para garantir a excelência na identidade visual”. Que conceito de modernidade é este capaz de despir a marca antiga dos principais elementos que a caracterizavam?
https://www.youtube.com/watch?v=FygDtd7b35U
Postado
no canal oficial dos Correios no YouTube no dia 15 de abril, menos de
um mês antes do lançamento da nova marca, o vídeo “Conexão” traz como o
principal elemento gráfico uma linha que conecta tudo e todos, que
percorre a tela e desenha o grafismo contido no símbolo (as setas) da
marca anterior. Neste vídeo ouvimos a seguinte afirmação: “Somos os Correios e temos planos para os seus próximos planos”.
Mas como assim? Se é uma empresa que se planeja de forma correta e está
prestes a lançar uma nova identidade visual, por que se apresentar
através de um elemento que foi completamente deixado de lado dias
depois? E por que deixaram de lado? Já que de acordo com o designer
sênior da CDA Branding, Richard Koubik: “Percebemos que o símbolo já
possuia um grande reconhecimento por parte do público, então com isso em
mente passamos a buscar cores, formas e traços que melhor
representassem a evolução desse símbolo.”
Apesar
de que muito ainda pode ser dito sobre as setas, prefiro me concentrar
no lettering, ou seja, no desenho das letras que formam a palavra
“Correios”, especificamente para esta marca, que é apresentado pela CDA
da seguinte maneira: “A construção do logotipo atual mantém o raciocínio
construtivo do logotipo anterior, e adiciona características
contemporâneas. Desta forma, o lettering foi construído de maneira
modular, tomando a letra “o” como referência para a construção dos
tipos. O redesenho em caixa baixa apenas com a inicial maiúscula,
simboliza uma assinatura pessoal, menos impositiva, tornando-a mais
próxima e amigável.”
Para início de
conversa, a concepção de que a simples combinação de caixa alta e baixa
(maiúscula e minúscula) remete a algo amigável por ser a forma como
escrevemos os nomes próprios é completamente equivocada, pois é tão
simplista como dizer que o resultado será um bolo pois um dos
ingredientes da receita é farinha. O logotipo poderia ter mantido a
estrutura em caixa alta ou até mesmo ser unicase (quando todas as letras
possuem a mesma altura, mas seus desenhos misturam maiúsculas e
minúsculas) e ainda assim ter um aspecto amigável. Ou seja, nenhuma
decisão isolada vai representar algo por si só; é o conjunto como um
todo que tem que falar a mesma língua e a combinação das decisões
tomadas é que tem que transmitir os conceitos pré-definidos.
Realmente
o novo logo foi construído utilizando o mesmo princípio do anterior, ou
seja, como base absolutamente geométrica. O manual da marca antiga não
está mais disponível no site dos Correios, mas ainda pode ser encontrado com uma rápida busca, e assim podemos conferir as especificações para o desenho de cada letra e a composição do conjunto.
A marca anterior com alinhamento na base e altura das letras
É
necessário dizer que tipos geométricos (bem desenhados e compensados),
por mais que pareçam desenhados com régua e compasso, não são
geometricamente perfeitos, e portanto, nem o logotipo atual e nem o
anterior estão corretos. Por que não? Porque os tipos possuem correções
óticas para que pareçam mais equilibrados, mas na realidade,
matematicamente, não são. As correções óticas fazem parte de princípios
básicos de design de tipos, pois leva em consideração como vemos e
entendemos as formas. Por exemplo, as linhas horizontais geralmente são
mais finas que as verticais, pois se elas tivessem a mesma espessura, a
horizontal pareceria mais grossa, assim, uma letra “o” não pode ser
concebida com dois círculos concêntricos, porque as partes de cima e de
baixo têm que ser oticamente compensadas para se parecerem iguais às
laterais. Portanto, não adianta desenhar letras e palavras pela
geometria, pois o resultado não fica tão harmônico e natural quanto o
desenho feito com as compensações necessárias. Muito complexo? Então
vamos exemplificar…
TypeBasics — ajustes óticos
Uma das minhas referências preferidas disponíveis online é o TypeBasics (se facilitar, tem uma tradução em espanhol)
— nele podemos encontrar alguns dos princípios básicos para desenho de
tipos, além de sermos apresentados brevemente a terminologias — e como
podem perceber, a primeira imagem é sobre ajustes óticos, para que as
letras pareçam proporcionais umas às outras, compartilhando de uma mesma
linha de base e altura-x, visualmente e não matematicamente, o que não
acontece no logo dos Correios.
Imagem do processo segundo vídeo de apresentação dos Correios
Alinhamentos do novo logotipo
Letras sobrepostas e suas inconsistências de tamanho/ alinhamento
Uma letra “o” diferente da outra em tamanho
Para
piorar a situação, as letras do novo logotipo não compartilham os
mesmos alinhamentos visualmente, e nem geometricamente. Cada letra
possui um tamanho e uma altura diferente. Pois é, nem uma letra “o” é do
mesmo tamanho da outra, e nem a base reta da letra “i” está na mesma
linha de base da letra “r”. Como isso é possível? Redimensionando sem
querer? Erro na hora de posicionar? Não vejo nenhuma explicação lógica
para tantas diferenças.
Malha construtiva do logotipo segundo vídeo de apresentação dos Correios
.
Para
que apresentar uma malha construtiva com algumas linhas genéricas que
nem coincidem com os alinhamentos do próprio desenho do logotipo? Muitos
criticam as empresas que ainda fazem um grid posterior ao desenho para
apresentar ao cliente. Neste caso, honestamente, acredito que ter
traçado as linhas de construção e alinhamento do logotipo teria ajudado a
conferir e corrigir alguns destes problemas, nem que o logo não
estivesse visualmente equilibrado, pelo menos estaria geometricamente
construído, tal qual seu antecessor, ainda assim errado
tipograficamente, mas pelo menos teria alguma lógica.
Desenvolvimento do logotipo segundo vídeo de apresentação dos Correios
“Foram
centenas de desenhos. Fomos filtrando as alternativas e o resultado foi
se concretizando. Aos poucos a marca foi ganhando corpo, forma,
personalidade e originalidade” citou Daniela Lompa Nunes, diretora de estratégia da CDA Branding
Os
esboços do logotipo apresentados no vídeo apenas reforçam a idéia que
tenho de que os responsáveis pelo desenho da marca não possuem qualquer
conhecimento tipográfico. Podemos ver uma série de tentativas de
redesenhar as setas, mas nem tantas do logotipo. Os rascunhos a lápis
sobre papel milimetrado não contemplam os espaços entre as letras. Isto
não é algo que se corrige depois. O espaço entre uma letra e outra é
necessário para que elas sejam reconhecidas, e esta área “branca”, que
faz com que as letras “respirem” influencia diretamente nas proporções e
pesos das letras ao seu redor, e vice-versa. Portanto, como bem disse o
Erik van Blokland na TYPOBerlin alguns dias atrás: “você começa a se preocupar com o espaçamento a partir do momento que desenhou a segunda letra”
(tradução livre). Em nenhum momento estes esboços demonstram a
preocupação com espaçamento. Com certeza as letras extremamente próximas
umas às outras não são por falta de espaço no papel.
Desenvolvimento do logotipo segundo vídeo de apresentação dos Correios
As
alternativas digitalizadas já demonstram uma pequena preocupação com o
espaço entre as letras, até porque se continuassem como nos rascunhos à
mão, a marca não teria leitura em tamanhos pequenos. No entanto, ainda
vemos problemas na hora de harmonizar o conjunto de caracteres. Eu sei
que esta parte é mais difícil para alguns perceberem, mas o que eu quero
dizer é que é recomendável, digo, obrigatório neste caso, que as letras
compartilhem o mesmo DNA. Não é porque existe uma malha construtiva
genérica dentro da qual as letras se encaixam, que elas serão similares,
mas também não adianta simplesmente cortar um “o” e colocar uma barra
no centro para fazer um “e”. Claro, uma letra pode derivar da outra, mas
cada uma tem a sua particularidade, ainda dentro da mesma linguagem da
estrutura proposta, e claro, com seus ajustes óticos. A necessidade de
coerência nas decisões também vale para os detalhes no acabamento. Por
que todas tem cantos retos e arredondados e o “i” sobrou só com os
arredondados?
O novo logotipo dos Correios
Como
nem as letras mais simples e básicas estão bem resolvidas (nem bem
espaçadas), como criticar algo minimamente mais complexo como o “r”?
Vê-se claramente a dificuldade em resolver a junção da reta com a curva.
E o “s” então? Daí pelo menos eu concordo que esta é uma das letras
mais difíceis de serem desenhadas. De qualquer forma, ele também não
está bem resolvido, pois além de ser o mais diferente da turma, a parte
de cima está visualmente pesando do lado esquerdo, fazendo com que ele
pareça estar caido para trás. Mesmo o “e” tem um ar de capenga, com esta
parte de baixo decepada prematuramente. Para contrastar com um exemplo
de algo desenhado corretamente, segue abaixo uma imagem da Avenir,
desenvolvida pelo Adrian Frutiger.
No
Brasil, o número de publicações e atividades da área aumenta a olhos
vistos a cada dia, tornando as informações mais acessíveis e
demonstrando um crescimento significativo do interesse em tipografia em
geral por parte do público, consequentemente, empresas buscam este tipo
de serviço especializado pois dificilmente tem em sua equipe alguém com
estes conhecimentos específicos, ou, acabam se aventurando a produzir
algo mesmo sem saber exatamente como, pois subestimam a complexidade por
trás de um desenho de letra/ palavra. Este, infelizmente me parece o
caso da CDA, pois considerando os fatores apresentados acima é difícil
de acreditar que houvesse na equipe responsável pelo redesenho do
logotipo uma única pessoa capacitada para a tarefa.
Portanto,
como acreditar no discurso apresentado no material de divulgação da
nova marca, se ele não está refletido no resultado gráfico?
Seja como for, se os Correios queriam “garantir a excelência na identidade visual”, não deveriam ter aprovado este resultado. Simples assim!
(*)Marina Chaccur
é designer de tipos e letrista freelancer, graduada em Desenho
Industrial/ Programação Visual pela Fundação Armando Alvares Penteado -
FAAP, com mestrado em Design Gráfico pelo London College of
Communication - LCC (MA Graphic Design) e Design de Tipos pela
Koninklijke Academie van Beeldende Kunsten -KABK (MA Type and Media).
Foi professora em algumas das principais graduações de Design em São
Paulo, posteriormente desenvolvendo sua própria oficina de lettering,
que tem sido realizada com grande sucesso, além de ter sido consultora
do Senac-SP na formulação da sua pós-graduação em Tipografia. Atua como
diretora da Association Typographique Internationale - ATypI e está
constantemente envolvida em congressos, palestras, workshops e
exposições no Brasil e no exterior.