"Rock brasileiro evoluiu, mas as bandas hoje têm que se virar"
Tony Bellotto, dos Titãs, fala de música na web
Publicada em 28/06/2011 às 08h42m
Marina Cohen (marina.cohen@oglobo.com.br)GABRIEL GORINI: Como você embarcou na vida dupla, de músico e escritor?
TONY BELLOTTO: Quando eu tinha 13 anos, já queria ter uma banda e também ser escritor. Aí, com 18, a música me pegou e deixei o sonho de ser autor de lado. Até que, já adulto, resolvi encarar de frente esse projeto da adolescência. Depois que escrevi o primeiro livro, "Bellini e a esfinge", a escrita passou a ser uma necessidade, assim como fazer música. São duas formas de expressão que convivem bem dentro de mim. É só uma questão de organização e disciplina.
JÉSSICA LOPES: Qual dos dois te dá mais prazer?
TONY: A música. É muito bom estar no palco e ver aquela canção que você compôs dentro de um quarto fazendo a multidão vibrar. Escrever dá outro tipo de satisfação: você sente uma euforia incrível no dia em que fecha uma história, mas é uma emoção solitária.
LAURA TARDIN: O Tony Bellotto que compõe é o mesmo que escreve romances?
TONY: O ato de criação é o mesmo: você tem uma inspiração e trabalha em cima dela. Se é um riff de guitarra, um romance ou um poema, isso vai ser definido depois. Agora, os processos são diferentes: a música só está pronta quando o resto da banda adiciona suas referências.
JÉSSICA MENDONÇA: Você traz a influência da literatura para a música?
TONY: Não diretamente, mas o ato de escrever me dá uma fluência na hora de fazer a letra de uma música. É que nem quando você malha para correr uma maratona.
TONY: O escritório, na minha casa, onde tenho meus livros, discos, guitarras... Lá começo a compor músicas, anoto ideias, escrevo crônicas etc.; Mas, quando estou empacado, gosto de correr ou nadar.
JÉSSICA LOPES: O detetive Bellini aparece em três livros. Como você o criou?
TONY: Foi inspirado em mim mesmo (risos). Coloco nele coisas que eu gostaria de dizer, mas tenho vergonha. Até o nome, Bellini, parece com Bellotto. Quando o criei, na adolescência, colocava o personagem para encarar histórias que eu vivi ou que gostaria de ter vivido. Só depois, quando retomei a escrita, transformei-o num detetive.
ROBERTA THOMAZ: O que a proximidade com a arte pode trazer de bom para o jovem?
TONY: A arte é fundamental não só na profissão. Ela te ensina a enxergar as situações de outra forma. Lendo, ouvindo música ou assistindo a um filme você escapa do cotidiano e vive experiências diversas. Nas peças de Shakespeare, por exemplo, ele explica nuances do comportamento humano, então você passa a entender melhor seus próprios sentimentos. Arte não só ajuda a gente a relaxar, como também a encarar a vida.
GABRIEL: Qual o papel da família na sua arte?
TONY: Ela dá um sentido a minha vida. Viajo muito por conta de shows, então dou valor aos momentos do cotidiano: acordar meus filhos, levá-los à escola... Esses momentos equilibram minha cabeça, porque se eu ficasse só na estrada me bateria um desespero.
JÉSSICA LOPES: O que você escuta em casa?
TONY: Cada vez ouço coisas mais antigas, como Rolling Stones, The Clash e meu mestre, Jimmy Hendrix. Das brasileiras, tenho escutado Pitty e Móveis Coloniais de Acaju.
" A crise da indústria de CDs fez com que a maioria dos grupos tenha que arcar com o investimento inicial "
TONY: O rock brasileiro evoluiu, ficou mais profissional e também mais rico. Quando fuço na internet, vejo que as bandas estão com uma variedade enorme de influências. Por um lado, a internet ajudou a divulgar grupos de todo o país. Não é mais preciso se mudar para o Rio ou São Paulo. Por outro lado, a crise da indústria de CDs fez com que a maioria dos grupos tenha que arcar com o investimento inicial. Antes, você ganhava dinheiro para gravar o primeiro álbum com calma e podia se dedicar exclusivamente a isso. Hoje, com o esquema independente, as bandas têm que se virar.
O GLOBO: Que conselho você dá a uma banda iniciante?
TONY: Para se destacar é preciso achar seu jeito de tocar e compor. Tem muito cara por aí que faz o solo de guitarra igualzinho ao do Slash, mas o que importa é fazer um solo com a sua marca. E, para encontrar aquilo que só você tem a dizer, é preciso trabalhar. Ir além da imitação e entender quem você é e como expressar isso na música.
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