PF indicia 29 por rombo de R$ 30 milhões via Lei Rouanet


Ação
é decorrente da Operação Boca Livre, que desmontou corrupção em
projetos culturais; para PF, falta de fiscalização permitiu 'duas
décadas de desvios'





A Polícia Federal indiciou 29 investigados na Operação Boca Livre – apuração sobre desvios de recursos públicos estimados em R$ 30 milhões liberados pelo Tesouro via Lei Rouanet.
O relatório final do inquérito da PF atribui a dez empresas parcerias
com o esquema supostamente montado pelo Grupo Bellini Cultural, alvo
principal da investigação. Foram indiciados empresários, um advogado e
executivos de grandes companhias – laboratórios, montadora, farmacêutica
e até banca de advocacia –, por estelionato contra a União e associação
criminosa. Alguns foram enquadrados também em falsidade ideológica.


A Boca Livre foi deflagrada em 28 de junho. Ela precedeu a Operação Boca Livre S/A, que saiu às ruas
em outubro e fez buscas em 29 empresas – patrocinadoras que atuaram em
conjunto com o Grupo Bellini, “associando-se aos seus integrantes com o
fim exclusivo de desviar recursos”. A PF evitou um rombo ainda maior, de
mais R$ 58 milhões, com a identificação de projetos fraudados que
estavam em curso e que permitiriam ao Grupo Bellini captar recursos
nesse montante. O relatório final da primeira operação foi encaminhado
ao Ministério Público Federal (MPF).


A PF indiciou executivos ou funcionários das empresas:
Intermédica Notredame, KPMG, Lojas Cem, NYCOMED PHARMA (Takeda), Grupo
Colorado, Cecil S/A, Scania, Roldão, Demarest Advogados e Laboratório
Cristália. Os investigadores apontam ainda fragilidades do Ministério da Cultura (MinC)
na concessão e fiscalização de recursos públicos que bancaram projetos
culturais desde o início da vigência da Rouanet, em 1992, até 2013.


Durante longo período os patrocínios eram aprovados, mas não
passavam por auditorias, o que, segundo a PF, permitiu a ação de
fraudadores. O relatório final sugere abertura de ação por improbidade
administrativa para responsabilização de funcionários do MinC por “danos
ao erário e omissão”. No âmbito criminal, a PF se deparou com um
“extenso lapso temporal”, entre as fraudes e a comunicação formal à
corporação, prejudicando a identificação de funcionários do Ministério
que teriam alguma ligação com a organização investigada.


Fraudes aprimoradas

A PF só foi informada dos desvios em 2014 por meio de uma
nota técnica da Controladoria-Geral da União (CGU). “O que tudo indica é
que não existiu uma fiscalização efetiva, que permitiu essas duas
décadas de desvios de recursos da Lei Rouanet”, destaca a delegada
Melissa Maximino Pastor, que presidiu o inquérito. “Quando o Ministério
da Cultura deu início à fiscalização dos projetos, em 2012, a associação
criminosa começou a aprimorar as fraudes. A investigação demonstra isso
empiricamente. Quando se inicia a fiscalização do órgão que libera e
controla o recurso público as fraudes ganham sofisticação.”


Em 2013, o Ministério da Cultura emitiu uma Instrução
Normativa restringindo a quantidade de projetos por pessoas jurídicas e
pessoas físicas. Na ocasião, foram bloqueadas contas de três empresas do
Grupo Bellini. “O Grupo Bellini, que até então estava com as contas
bloqueadas, começa a se utilizar de mais empresas, em nome de
funcionários, por isso essa quantidade de indiciados.”


A PF identificou nove empresas que fizeram parceria com o
Bellini Cultural e outras três que auxiliavam o grupo nas fraudes, além
de diversas pessoas físicas. Essa “estrutura de papel” obteve junto ao
Ministério mais de uma centena de projetos. O relatório final da Boca
Livre foi encaminhado ao Ministério Público Federal. O inquérito foi
aberto no final de 2014 e seguiu para a Inteligência da PF em novembro
de 2015, quando as investigações começaram a ganhar fôlego.


A Polícia Federal afirma que o Ministério da Cultura foi
avisado das irregularidades, envolvendo projetos do Grupo Bellini e
servidores da pasta, três anos antes dos investigadores receberem a
denúncia. “Um rastreamento preliminar revelou indícios de adulteração de
documentos, projetos extremamente similares, um projeto igualzinho ao
outro, um dos dois não aconteceu”, relata Melissa.


Cantores famosos

“A falta de fiscalização permitiu a continuidade delitiva
até a deflagração da operação, em junho de 2016”, afirma a delegada
federal, que revela ter descoberto, também, uma “lei invisível do
mercado cultural”, sob a qual produtoras teriam de oferecer ou aceitar
exigências ilícitas de grandes empresas para garantir o aporte no
projeto cultural. Ela ressalta que as empresas já possuem uma grande
vantagem, que é a vinculação de um projeto cultural à sua marca sem
custos – uma vez que, para as que tem um lucro real de até 4%, o
dinheiro utilizado no patrocínio é abatido do imposto de renda.


Entre essas contrapartidas, segundo a PF, indiciados do
núcleo central do Grupo Bellini contaram que empresas exigiam
contrapartidas como, por exemplo, festas de final de ano com cantores
famosos, em troca de apoio aos projetos. “A disputa era tão acirrada
entre os produtores culturais que se não atendessem às solicitações não
iriam conseguir aporte em nenhum projeto cultural”, assinala a delegada.
“A investigações confirmaram isso. As grandes empresas tiveram
inclusive a coragem de formalizar contratos de patrocínio com objetos
ilícitos.”



fonte:

PF indicia 29 por rombo de R$ 30 milhões via Lei Rouanet | VEJA.com

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