Espécie marinha exótica é reencontrada na Baía de Guanabara após 17 anos




Débora Motta

                                                                     Divulgação
   
    Ciona intestinalis costuma competir com outras
    espécies marinhas por espaço, comida e oxigênio
Os oceanos guardam mais surpresas do que se pode imaginar. Pesquisa coordenada pelo biólogo Luís Felipe Skinner, do Grupo de Ecologia e Dinâmica Bêntica Marinha da Universidade do Estado do Rio de Janeiro (Uerj), registra a ocorrência de uma espécie marinha exótica nas águas da Baía de Guanabara, na região da Urca: a Ciona intestinalis. "Esse animal é uma espécie de ascídia, que é um cordado primitivo", explica o professor. A última vez que a espécie foi encontrada próxima à entrada da baía, na Urca, foi em 1991. "Desde essa época, os especialistas chegaram a acreditar que ela tivesse desaparecido das águas da Guanabara, e até mesmo dos mares brasileiros", conta Skinner, que recebeu auxílio da Fundação para a pesquisa por meio de um APQ1. A expressão "espécie marinha exótica" refere-se a todas as espécies do mar que se estabelecem, devido à ação humana, em um território onde estavam originalmente ausentes. Esse transporte pode ser voluntário ou involuntário. "As espécies exóticas são um dos principais problemas derivados do intenso tráfego marítimo no mundo. Elas podem viajar aderidas nos cascos ou então na água de lastro de embarcações e plataformas, estando associadas à atividade portuária", diz o biólogo, que ainda desconhece a origem da Ciona intestinalis presente na Baía de Guanabara.
A introdução de espécies marinhas exóticas em um novo ecossistema pode trazer efeitos negativos. De acordo com Skinner, dois casos que ilustram os prejuízos causados pela introdução dessas espécies em novos habitats são o mexilhão-zebra, nos Estados Unidos, e o mexilhão dourado, na Bacia do Prata: "A introdução do pequeno bivalve (mexilhão), conhecido como mexilhão-zebra, na região dos Grandes Lagos dos Estados Unidos trouxe impactos econômicos da ordem de um bilhão de dólares anual para o seu controle. A invasão do mexilhão dourado, outro molusco, também traz grandes prejuízos na Bacia do Prata. Esses animais se proliferam e entopem dutos de transporte de água e de escoamento da rede de esgoto, além de reduzirem a passagem da água nas usinas hidrelétricas."
No caso da Ciona intestinalis, o biólogo ainda não observou danos ao ecossistema marinho da baía, mas não descarta a possibilidade de efeitos negativos. "Embora não represente nenhum problema aparente para o ecossistema da Baía de Guanabara, em muitos locais do mundo, como na Austrália, a Ciona é conhecida por competir por espaço, alimento e até por oxigênio com outras espécies nativas, impedindo seu crescimento e até mesmo reduzindo a biodiversidade. Ela pode inclusive levar à morte espécies de interesse comercial, como mexilhões e ostras, principalmente em cultivos", alerta.
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 Armadilha colocada no mar isola a espécie
 exótica dos peixes, predadores naturais  
A origem do nome da Ciona intestinalis é uma alusão a sua aparência peculiar. O revestimento externo de seu corpo (túnica) é bastante fino, macio e transparente, o que permite a visualização dos órgãos internos. "Devido a essa característica, a espécie é muito consumida por outros animais, especialmente pelos peixes. Essa predação natural explica porque ela não foi observada nas águas da baía nos últimos 17 anos", diz Skinner, acrescentando que desconhece casos em que a Ciona intestinalis tenha prejudicado os peixes que a consumiram. Para encontrar a espécie, a equipe de biólogos marinhos da Uerj realizou experimentos que tiveram como base uma tática de contenção dos predadores naturais da Ciona intestinalis, que vive em ambientes com até cerca de 200 metros de profundidade. "Colocamos uma armadilha, formada por caixas plásticas com blocos de granito em seu interior, mergulhada no mar da Urca, a uma profundidade de um metro e meio, para servir de local de colonização para a Ciona. Impedimos assim a aproximação dos peixes que se alimentam da Ciona, fechando a armadilha com telas. Em apenas 15 dias encontramos a espécie", diz o professor. E prossegue: "A falta de experimentos desse tipo – que impedissem os peixes de ter acesso à Ciona e a devorassem – certamente contribuiu para que ela não tenha sido registrada nas águas da Guanabara por esse período de 17  anos. A espécie sofreu predação."
Além de avaliar a espécie exótica, a pesquisa – enviada para análise do periódico britânico Journal of Marine Biology Association of United Kingdom – tem como objeto de estudo outros animais da fauna marinha. "O estudo, que tem prazo previsto até o fim do próximo ano, também propõe ampliar os conhecimentos sobre a diversidade da fauna marinha em diversos pontos da Baía de Guanabara, para conhecer melhor o ecossistema e relacioná-lo com os impactos da poluição orgânica e industrial", diz Skinner. Ele adianta que outras espécies marítimas exóticas devem ser registradas no local durante a pesquisa.



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